Acontece no APUBH

“Me afirmar como professora é também uma forma de resistir”, diz Luana Tolentino

Frase foi dita em mesa realizada na manhã do 2º dia da Semana Negra do APUBH

A mesa redonda “Formação inicial de professores e o trabalho com a Educação para as Relações Étnico Raciais” abriu o segundo dia da Semana Negra do APUBH, ontem, 04/11. A convidada foi a professora da UFOP e mestre em educação pela mesma instituição, Luana Tolentino. A coordenação da atividade foi responsabilidade da 1ª vice-presidenta do APUBH, professora Analise de Jesus da Silva.

Em sua fala inicial, a professora Analise destacou a relevância da reflexão sobre o tema da mesa. Segundo ela, é necessário que aqueles que vão atuar nas Escolas de Educação Básica saibam que vão lidar com “estudantes, crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos, que são moradores de periferia, que são negros, que são pobres”.

Para a professora, é importante compreender que ser professor ou professora “não é uma profissão como outra qualquer”. É uma profissão que “demanda compromisso, comprometimento, competência técnica, responsabilidade social e demanda, principalmente, a compreensão de que os sujeitos com os quais na educação básica partilha saberes e sabores que, às vezes, são amargos são sujeitos de direitos previstos na constituição federal. E que a gente precisa o tempo todo se lembrar da existência deles, em especial, nesses tempos de pandemônio que a gente está vivendo”.

Luana Tolentino começou sua apresentação falando do orgulho que sente em ser professora da educação básica, apesar de ser, “na maior parte do tempo, uma profissão desqualificada, desconsiderada”. Ela ainda destacou que os professores têm vivido “cada vez mais um processo de violência simbólica e muitas vezes física, por parte das instâncias governamentais”.

“Me afirmar como professora é também uma forma de resistir”, diz Luana Tolentino

No entanto, a professora explicou que vê o seu orgulho e felicidade em ser professora como uma forma de “dizer não, de não aceitar e de fazer frente às tentativas de silenciamento, de deslegitimação, à mediocridade, a esse movimento de pensar a educação pública, a educação básica como uma ferramenta de manutenção das desigualdades sócio raciais que marcam nosso país. Quando eu afirmo o meu orgulho em ser professora, eu estou dizendo não a tudo isso.  E estou reivindicando também um outro olhar, um outro lugar para nós professores. Me afirmar como professora é também uma forma de resistir a todas essas dificuldades”.

Em sua exposição, a professora Luana falou sobre as dificuldades enfrentadas por negras e negras para ingresso e permanência nas instituições de ensino básica, médio e superior. Ela lembrou também dos avanços das políticas públicas de superação das injustiças raciais que “estão intimamente ligadas à atuação do movimento negro”.  E como exemplo, citou a lei 10639/03 que instituiu a obrigatoriedade da inclusão da História e Cultura Afro-Brasileira e Africana nos currículos das escolas. Luana ressaltou ainda a importância do desenvolvimento e implantação de políticas antirracistas nas escolas e universidades como mecanismo de combate às práticas que favorecem ou reforçam a exclusão de estudantes negros e negras.

No encerramento da mesa, a professora Analise agradeceu a presença e as contribuições da convidada para a reflexão sobre a prática da educação básica e a formação de professores para o trabalho com a educação para as relações étnico-raciais. Para ela, essa formação pode ser para que “os futuros docentes reconheçam as questões do povo negro e reconhecimento é assumir a bandeira junto”.  Porém, ela ponderou que “dependendo da prática na educação superior, pode ser “uma formação de professores da educação das relações étnico raciais que subalternize, que humilhe, que animalize, que desumanize os sujeitos negros na sala de aula”.

Assista a Mesa na íntegra: https://bit.ly/2IbilK7

“Racismo silencioso é uma forma de racismo que se reproduz nas instituições”

Às 17 horas do dia 04/11, iniciou-se a mesa redonda “Gestão universitária e racismo institucional”, com participação de Licínia Correa, Yone Gonzaga, ambas da UFMG, e de Adilson Santos (UFOP). Nas boas-vindas aos convidados e participantes, a 1ª vice-presidenta do APUBH, a professora Analise manifestou o desejo de que “à medida em que essas semanas [Semana Negra do APUBH] forem acontecendo que a gente tenha menos denúncias de racismo institucional para trazer e mais comemorações de derrota deste mesmo racismo”.

“Racismo silencioso é uma forma de racismo que se reproduz nas instituições”

Analise explicou ainda que essa mesa tem a intenção de “dialogar para contribuir para que haja cada vez mais situações de formação de uma educação para as relações étnico-raciais, uma formação de cada um de nós, que reverbere na formação de sociedade, que repercuta na formação de um país não só menos racista, mas fundamentalmente, antirracista”.

Mediadora da discussão, Licínia Correa apresentou uma definição de racismo institucional do Programa de Combate ao Racismo Institucional (2005), para iniciar a conversa: “o fracasso das instituições e organizações em prover um serviço profissional professional e adequado às pessoas em virtude de sua cor, cultura ou original racial ou étnica, isso é racismo institucional. Ele se manifesta em normas, práticas e comportamentos adotados no cotidiano do trabalho, os quais são resultantes do preconceito racial”.

Adilson Santos (UFOP), ao falar sobre a sua experiência com gestão institucional, chamou atenção para o fato de haver “uma forma de racismo institucional que se reproduz dentro das instâncias institucionais e dentro da universidade que é o racismo silencioso”.

“O meu corpo diz coisas que eu não expresso em palavras”, a frase do ex–reitor da UFMG, professor Tomaz Aroldo, foi citada por Yone Gonzaga. De acordo com ela, essa frase “fala muito dos nossos lugares institucionais”. E disse ainda que, para pensar o racismo institucional e vivência na universidade é importante pensar sobre “quantas coisas os nossos corpos dizem, que a universidade silencia”. Falando sobre sua trajetória na universidade, Gonzaga ressaltou que o racismo institucional se apresenta também no mundo do trabalho, na formação e em outras instâncias.

Para Adilson, nas universidades hoje a militância contra o racismo ainda passa por uma militância institucional e pessoal. “Não é um projeto institucional, ela precisa se converter em projeto institucional. E, converter em projeto institucional significa assumir a responsabilidade, por exemplo, com uma discussão de currículo de gestão com a incorporação da dimensão étnico-racial nos currículos”, disse.

Outro ponto destacado por Adilson é de que o racismo tem a capacidade de atualizar e se adaptar à conjuntura.  Para ele, nesse sentido, “as estratégias, a luta e a bandeira antirracista precisam ser atualizadas para darem conta da realidade e da conjuntura que as enredam num determinado momento”.

Assista a Mesa na íntegra: https://youtu.be/XEQs9no9ZUI

Ex- Reitor Tomaz Aroldo Gonzaga, Presente!

O segundo dia de atividades foi encerrado com a exibição do vídeo documentário “Tomaz Aroldo”, do cineasta Rodrigo Campos e produção do APUBH UFMG+. Primeiro e único reitor negro da UFMG, o professor Tomaz Aroldo Gonzaga, faleceu em 18 de junho deste ano e é o grande homenageado da II Semana Negra do APUBH.

A professora da Faculdade de Letras da UFMG, Sara Rojo, convidada da noite, ao falar sobre o vídeo explicou que o documentário “registra um outro trânsito, um trânsito que chamamos aqui de trânsito dos encontros”. E completou dizendo que “Tomaz era uma pessoa voltada para os outros, por isso a ênfase nos encontros”. Ela ainda citou uma descrição do professor feita por seu filho Daniel: “ele era uma pessoa que se detinha nas suas caminhadas para conversar com todas e todos e para escutar”.

Vídeo documentário Tomaz Aroldo, merecida homenagem ao primeiro e único reitor negro da UFMG

Sara Rojo lembrou também do seu primeiro encontro com Tomaz e de suas realizações. “Cada imagem que fica na minha memória foi se transformando num exemplo a ser seguido na luta pela construção de uma universidade pública que abraçasse a todos e todas”, disse.

Assista a Mesa na íntegra: https://youtu.be/EpCzvgn-uZs  e o documentário: https://youtu.be/iupBsJJ7cE4

 

 

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