Educação Popular Negra foi tema de mesa redonda da II Semana Negra do APUBH
Semana homenageou o Reitor da UFMG Tomaz Aroldo
“É uma atividade em que a gente pretende visibilizar as coisas maravilhosas que o povo negro tem feito pra se contrapor a essa necropolítica, a qual a gente está sendo submetido não só a partir desse governo, mas, desde que alguém viu em nós a possibilidade de sermos objeto de lucro, de prazer. Desde que a raizinha, o germezinho da ideia de que a universidade pública não é lugar para nós. Sejamos nós, docentes, estudantes, técnicos, movimentos sociais, movimentos culturais, movimentos sindicais em diálogo com essa universidade pública”. Com essa frase, a 1ª vice-presidenta do APUBH, professora Analise Jesus da Silva abriu a mesa “Educação Popular Negra”. Foram convidados para a atividade Evandro Passos (Mestre em Artes Cênicas – artista/educador), Gil Amâncio (Artista multimídia e idealizador do Festival de Arte Negra em BH) e Natalino Neves da Silva (UFMG).
Sobre a educação popular negra, o professor da Faculdade de Educação da UFMG, Natalino Neves da Silva argumentou que “pensar em termos da educação popular negra significa desenvolver, a meu ver, a capacidade crítica em relação à narrativa da grande história única que foi aprendida na escola”. E que “é necessário assumir uma postura investigativa em busca de outros agenciamentos ocorridos ao longo da história realizados por atores sociais os quais foram produzidos como inferiores, incivilizados e indiferentes”.
Para Silva, ao serem construídos dessa forma, os povos africanizados e ameríndios tiveram a sua humanidade negada. “Então falar de uma maneira muito alargada a respeito de direitos humanos é primeiro reconhecer que essa população do ponto de vista de uma história hegemônica, de uma história única não teve reconhecidos os seus agenciamentos de enfrentamento, de luta, de conquista, de reivindicações, de resistência”, completou.
Finalizando a sua fala, o professor explicou que a educação popular negra possibilita o entendimento de como os saberes populares “se concretizam na cotidianidade” e colocam “em evidência o protagonismo, sobretudo, do sujeito político negro e negra na realização da cultura e da educação popular”.
O artista multimídia e idealizador do Festival de Arte Negra em BH, Gil Amâncio fez uma exposição sobre cultura, música e dança africana destacando que “é nas diásporas africanas que emerge uma contracultura ao modelo colonizador euro cristão e capitalista”. Para o artista, “a música/dança que emerge desses movimentos não pode ser reduzida a uma experiência estética. Ela é um território de r(e)existência e a expressão de um modo de habitar o mundo”.
De acordo com Amâncio, o conhecimento produzido a partir da experimentação musical é um conhecimento que emerge de uma percepção múltipla da vida e da natureza, ou seja, de uma cosmovisão, cosmo-audição, cosmo-paladar, cosmo-olfativa, cosmo-cinestesia, cosmo-tátil. E é “esse pensamento poli afro diaspórico que orienta o fazer musical e os processos de aprendizagem nas diásporas africanas”, explicou.
Evandro Passos, mestre em Artes Cênicas, artista/educador e pesquisador de danças de matrizes africanas lembrou de sua experiência e de muitos outros negros e negras com as aulas de dança/balé clássico em que se ouvia que “nossos corpos não eram aptos para praticar o balé clássico porque nós tínhamos pé chato, bunda grande e não tínhamos a leveza do corpo europeu”.
O mestre explicou que eram aulas ministradas por professores que não respeitavam a nossa herança afro diaspórica. Prosseguindo, ele também falou sobre o papel das escolas que negligenciavam e ainda negligenciam em seus currículos os saberes das danças que “está no registro, está no nosso corpo, está registrado em nossos corpos. A música e a dança são os primeiros registros de uma criança, um jovem e, principalmente, de uma criança negra”.
Para Passos, esse comportamento das escolas provoca a evasão das crianças e jovens negros, porque é uma escola eurocentrada que não respeita seus saberes, sua ancestralidade e a sua musicalidade. A escola eurocentrada, ela ainda massacra, humilha e reproduz o racismo. O racismo brasileiro começa nas escolas. Começa exatamente a partir da negação da religiosidade afro-brasileira, da negação dos movimentos artísticos afro-brasileiros”, disse.
Por isso, ele chamou a atenção para a lei 10.639/2003 que significou, em sua perspectiva, uma ruptura muito grande por mexer com a estrutura das escolas brasileiras. Amâncio lamenta, porém, que a lei foi e está sendo banida “porque a escola eurocentrada não quer esse saber (africano, das comunidades quilombolas) lá. Mas não é por isso que nós não vamos trazer, que nós não vamos fazer”. O mestre falou ainda do papel das ações, movimentos e festivais artísticos negros para a valorização da cultura afro popular brasileira, para educação popular e para o movimento negro educador.
Confira a íntegra da mesa:https://youtu.be/_DFatuJon0U
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