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SÍNTESE das Contribuições da Comunidade Acadêmica ao Plano de C&TI para o Desenvolvimento Econômico e Social de Minas Gerais

Fonte: Blog do Pensar a Educação.

Ciência, Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Econômico e Social de Minas Gerais.

Data: 20/11/2019

Local: CAD 3- Auditório B – 106 (UFMG- Campus Pampulha)

Objetivo: Reunir contribuições da comunidade acadêmica e científica mineira para a elaboração do Plano de Ciências e Tecnologia e Inovação para o desenvolvimento econômico e social mineiro.

 

Mesa 2 – Ciência, Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento econômico e social de Minas Gerais

Coordenação: Profa Zélia Profeta –  Fiocruz
Relatoria: Ana Flávia Quintão – ESP-MG

Exposições e Discussões:

  • Importância da construção de agendas positivas no atual cenário político de restrições econômicas para o setor de Ciência, Tecnologia e Inovação, como o plano que será proposto por esse Fórum Técnico, propostas para curto, médio e longo prazo.
  • Vivemos um processo de desmonte das agências de fomento e das instituições de pesquisa no Brasil e em MG (FAPEMIG). Nesse contexto, a construção de um plano de Ciência, Tecnologia e Inovação é resposta ao cenário atual de redução de investimentos, além de ser ferramenta de orientação para as instituições de ensino e pesquisa.
  • Gestão de fundação de amparo à pesquisa tem as atividades desconhecidas ou pouco conhecidas pela sociedade. Fazemos pouca ciência no Brasil (comparativamente à outros países do mundo) e temos dificuldade de comunicar essa ciência com a sociedade, que possui carências no processo de educação. Isso enfraquece a defesa das atividades de pesquisa, no atual cenário de desmonte.
  • É preciso melhorar a comunicação geral das agências de fomento, instituições de pesquisa e pesquisadores com a sociedade, setores econômicos e governo.
  • O maior problema no Brasil é a desigualdade socioeconômica e a ciência tem muito à contribuir com os processos de geração de riqueza e renda. O campo da ciência já faz muitas contribuições nesse aspecto, mas é preciso ampliar essa contribuição e comunicar melhor a importância da ciência para o desenvolvimento socioeconômico do país. Geração de conhecimento, valores da academia e das pesquisas se revertem em artigos, com valor acadêmico, mas esses não são valores da sociedade. Torna-se muito importante traduzir esse conhecimento, além da formação de redes de pesquisa para maior impacto social.
  • Direitos humanos é um bom tema pra pensar em como ancorar propostas de desenvolvimento socioeconômico para o estado, considerando as parcelas mais vulnerabilizadas em Minas Gerais. Busca de outro paradigma de desenvolvimento é central nessa discussão.
  • Um terço dos brasileiros desconfiam da ciência, esse é o tamanho do nosso desafio.
  • Os processos de avaliação dos trabalhos acadêmicos precisam considerar as contribuições dos mesmos para a sociedade, contribuindo inclusive para a construção de políticas públicas. Avaliação por parte da comunidade, enfrentando a hierarquização dos campos de conhecimento científico.
  • Hierarquia dos conhecimentos científicos e a interação com o saber local é desafio para a realidade. Reconhecimento do saber local é altamente relevante para a produção de ciência e tecnologia voltadas para o desenvolvimento socioeconômico. A sociedade precisa ter seu próprio saber reconhecido.
  • Relevância da sociedade civil na construção dos processos de produção de conhecimento no campo de ciência e tecnologia, voltados para o desenvolvimento socioeconômico.
  • O que determina a riqueza de uma sociedade é o total de saber social, o quanto ela sabe fazer é importante para o seu crescimento.
  • Indivíduos não possuem a totalidade desse conhecimento. Dessa forma, é importante aumentar esse conhecimento de maneira distribuída na sociedade, ampliando seu conhecimento global. Esse conhecimento ampliado se transforma na geração de riqueza por meio de estruturas institucionais que juntam esse conhecimento e o transformam em riqueza. Quanto maior diversidade de saber, que se transforma em maior diversidade produtiva, maior a riqueza de um país. Maior complexidade do sistema produtivo. Não precisamos ser apenas exportadores de commodities, precisamos de formas mais complexas de geração de riqueza.
  • Minas Gerais tem produção de conhecimento elevada, temos cerca de 20% das universidades federais do pais e outras instituições de produção de conhecimento e formação de mão de obra. Contradição: muita produção de conhecimento e formação de mão de obra, mas com estrutura produtiva pouco diversificada. Importante estrutura permanente de diálogo da massa de conhecimento com os setores produtivos.
  • Projetos de desenvolvimento econômico e social devem considerar as origens das mazelas do nosso país, que possuem origem violenta e autoritária, fruto da colonização. As violências que nos constituem devem ser fortemente consideradas nas novas propostas de desenvolvimento econômico e social, por meio das ações de ciência e tecnologia.
  • Necessário vencer o desafio imposto pelas novas gerações, relacionados ao sofrimento mental, diante do grave contexto que vivemos. Importante incluir os estudantes nos processos de construção social, dentro das universidades.
  • A compreensão da universidade como sociedade ainda não está colocada no meio acadêmico, há muito trabalho pra fazer nessa perspectiva. Fortalecimento das atividades de extensão, diálogos com a sociedade, fóruns técnicos e outras esferas é fundamental. Para isso serão necessários planos, várias ações e recursos distintos.
  • Perspectivas feministas nos convidam a tensionar a separação entre público e privado. O privado precisa ser problematizado na perspectiva de gênero, raça, faixas etárias.
  • Para a construção de processos e concepções de desenvolvimento socioeconômico, a interação entre as diversas ciências se faz imprescindível, transdisciplinaridade e interdisciplinaridade devem ocorrer na prática, pois os problemas da sociedade não são problemas disciplinares. Rompimentos de barragens interpelam diversos setores de produção de conhecimento, o olhar para essa realidade vai exigir deslocamento disciplinar, ampliando o diálogo inter e transdiciplinar.

 

Mesa 3- Ciência, Tecnologia e Inovação para formulação de Políticas Públicas

Coordenação: Rodrigo Souza Leite (FUNED)
Relatora: Rose Ferraz Carmo (ESP-MG)

Sobre o tema Educação o Prof. Carlos Henrique Carvalho (UFU/SBPC) destacou pontos importantes relacionados ao tema da Ciência, Tecnologia e Inovação: a ação coletiva – referente à mobilização de entes coletivos a exemplo da  Andifes, Fóruns de pró-reitores etc., pela preservação do sistema de educação; a comunicação – referente à importância da inclusão da sociedade civil como co-partícipe de todo processo de comunicação científica, com o  reconhecimento do espaço da grande mídia para discutir a relação da universidade com a sociedade.

Aponta desafios como: pouca interação entre agências de fomento, instituições de ensino e pesquisadores para delimitação de prioridades de investimento; falta de continuidade e integração das políticas de financiamento; falta de integração entre órgãos, universidades e sociedade civil; necessidade da articulação em sistemas e redes (destacando a importância da comunicação com municípios, sobretudo em um Estado com tanta diversidade); inclusão de uma perspectiva histórica crítica e interdisciplinar envolvendo problemas relativos à educação básica; capilaridade das publicações produzidas pelos pesquisadores em suas instituições.

O professor ressalta que apesar de avanços, como a inclusão e permanência na Escola incluindo educação de jovens e adultos, ainda há problemas não sanados, como a gestão da educação que deve ser compreendida em uma dimensão ampla que ultrapassa unidades escolares com a criação e recriação de formas de governança do ambiente escolar.

Sobre o tema Saúde o prof. Marco Antônio Vargas (UFF/ FIOCRUZ) apresentou um panorama global de CT& I  demonstrando: a liderança de países como Índia e China no ranking da produção científica; o aumento da produção científica e de publicações no Brasil, mas ainda a ritmo pequeno; o avanço de patentes no setor farmacêutico entre 2009-2011 no Brasil, considerado ainda pequeno quando comparado ao cenário internacional; a retomada, entre 2003-2015, da Política Industrial; e a forte articulação entre Política de Saúde e Política Industrial.

O professor destacou que: a perspectiva sistêmica da Política Industrial avança para além do financiamento, incluindo avanços no arcabouço regulatório (ex: Lei do acesso ao patrimônio genético); as indústrias farmacêuticas usaram incentivos governamentais em níveis mais altos que outros setores; a Política de Saúde deve ser considerada como elemento fundamental para a Política Industrial e Econômica.

O professor apresentou um dado importante sobre o Orçamento Público destinado a Pesquisa e inovação, que atualmente é inferior ao do início dos anos 2000.

No que diz respeito ao panorama nacional de política industrial e de inovação em saúde, o professor destacou a importância de uma nova forma de posicionamento que leve em consideração os cenários atuais e que aponte para a convergência entre Política de Saúde e Política Industrial.

Sobre a articulação entre sistemas de inovação e bem estar, oprofessor ressaltou que  a dimensão sócio sanitária que diz respeito à saúde como fator estruturante do Estado de Bem Estar avança em um nível inferior à dimensão econômica que compreende a  saúde como vetor de desenvolvimento econômico e de inovação.

Com relação aos desafios para o desenvolvimento de uma política de C, T & I, o professor apontou: a necessidade de promover a articulação entre a lógica econômica e a lógica sócio sanitária no processo de inovação em saúde, captando tensões e interfaces existentes entre eles; a importância da inclusão de temas como doenças negligenciadas e questões relacionadas à Atenção Primária à Saúde; a necessidade de visão menos ofertista e linear e mais sistêmica e estruturante.

O professor ponderou  que a construção de canais de comunicação com a população talvez seja o mote para o momento e concluiu que avanços nas Políticas de CT & I não se resumem a financiamento, há necessidade de regulação e conhecimento sobre a demanda, por exemplo e que essas Políticas devem estar condicionadas a redução de desigualdades de acesso, redução de custos e atendimento às demandas do SUS.

Sobre o tema Desenvolvimento Regional e Urbano, o prof. Geraldo Magela Costa  (UFMG) ressaltou que a abordagem sobre o território exige uma visão transversal e transdisciplinar, nesse sentido apresentou a perspectiva do Planejamento compreensivo que propõe o conhecimento exaustivo de cada região.

Ressaltou um novo panorama onde é menos importante o diagnóstico/plano como processo e mais importante como estratégia/gestão.

Ponderou que existem ações públicas que têm importância regional apesar de não terem o nome de Política Territorial, e propôs que o Plano de CT &I deve integrar o desenvolvimento regional com as outras políticas (como educação, saúde, etc.) e que a dimensão territorial deve ser orientadora.

 

Mesa 4- Ciência, Tecnologia e Inovação e a utilização de recursos naturais

Coordenador: Dra. Cristiane Viana G. Ladeira – Epamig

Relatora: Dra. Andréa Mara Macedo – UFMG

A mesa 4  foi composta por três palestrantes convidados: (i) Dr. Geraldo Wilson, ecólogo, professor titular do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG e membro da Academia Brasileira de Ciências, (ii) Dra. Daniela Adil, bióloga, coordenadora do grupo AUÊ e diretora de Fomento de Agricultura Urbana Familiar e Abastecimento da PBH e (iii) Dra. Andréa Zhoury, antropóloga, professora da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG e coordenadora do GESTA. O principal objetivo da mesa foi levantar e discutir alternativas para a promoção do desenvolvimento social e econômico mineiro, com inclusão, distribuição de renda, igualde de gênero e raça, sustentabilidade e preservação ambiental.

Esse é um desafio que continua sendo atual e gigantesco, mesmo tendo se passado quase 50 anos da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, também conhecida como a Conferência de Estocolmo, que ocorreu em junho de 1972, e que foi o marco inaugural das tentativas de busca do equilíbrio entre o desenvolvimento e crescimento econômico e a redução da degradação do meio ambiente.

De lá para cá, ocorreram várias outras reuniões e conferências, incluindo uma delas aqui no Brasil, a Eco-92 – Cúpula da Terra, quando o conceito de Desenvolvimento Sustentável foi popularizado.

Embora a preocupação dos países com o o desenvolvimento sustentável seja genuína, na prática, pouco se avançou nestes quase 50 anos, em parte pela dificuldade de se envolver verdadeiramente a sociedade na discussão do modelo de desenvolvimento que queremos, em parte por características intrínsecas ao capitalismo, e em parte por falta de emprenho de autoridades governamentais.

 

O que podemos fazer então para termos um plano de CT&I exequível e assertivo para o Estado de Minas Gerais?

 

Na visão do Dr. Geraldo Wilson

Segundo o pesquisador, uma estratégia seria investir no aproveitamento sustentável da biodiversidade do cerrado, que não apenas é comparável à riqueza natural da floresta amazônica, mas como em muitos aspectos a suplanta. Segundo ele, o Brasil seria o segundo maior país no mundo em biodiversidade, configurando o cerrado o segundo maior bioma brasileiro e o primeiro no estado de Minas Gerais.

Como exemplo de riquezas presentes no cerrado, ainda muito pouco exploradas, ele destaca a presença de uma variedade de micorrizas, fungos associados a raízes de plantas vasculares, de grande interesse e alto valor econômico. O uso adequado destes fungos aumenta a fertilidade natural dos solos, reduz a necessidade do emprego de  fertilizantes  químicos  e  contribui  para  alcançar  um padrão de agricultura mais sustentável e menos dependente de insumos. Dr. Wilson chama a atenção para o fato de que cerca de ¼ da diversidade de micorrizas do planeta está no cerrado mineiro.  Menciona ainda a produção do própolis verde, de alto valor agregado, atualmente utilizado no Japão, para tratamento auxiliar de cânceres. Produzido a partir do alecrim-do-campo, 90% de sua produção advém do cerrado mineiro.

Prossegue o Dr. Wilson ressaltando ainda: (i) a diversidade social do cerrado –  dos 200 grupos étnicos no Brasil, 38 estão presentes no cerrado mineiro; (ii) a  preciosidade dos reservatórios aquíferos deste bioma, que é responsável por 70% das águas das bacias que cobrem o Estado; (iii) a beleza inexplorada e a diversidade de sua fauna e flora; (iv) a presença de cavernas e pinturas rupestres de valores históricos e para o ecoturismo; (v) a presença de montanhas de quartzo, ferro, que precisam ser exploradas de maneira mais sustentável.

Termina o pesquisador nos convidando a uma relevante reflexão: apesar da importância biológica estratégica do cerrado mineiro para a segurança hídrica, alimentar, biodiversidade, estabilidade climática, cultura, conhecimento e história, ele compete com 54 milhões de pastagens e 72 milhões de cabeças de gados. Segundo ele, a demanda mundial por recursos “arranca o nosso cerrado”. Salienta o quão urgente é desenvolvermos uma economia inovadora, com baixas emissões de carbono, capaz de conciliar as exigências para agricultura sustentável, segurança alimentar e o uso sustentável dos recursos renováveis do cerrado mineiro.

 

Na visão da Dra. Daniela Adil

Segundo a pesquisadora, é necessário apostar em uma agenda estratégica que ofereça conexões com necessidades da sociedade contemporânea e, ao mesmo tempo, que promova transformações sociais e engajamentos coletivos. Nesse cenário, a agroecologia surge como uma alternativa, visto que oferece respostas concretas e rápidas para problemas sociais, como a segurança alimentar e a conservação ambiental, tem raízes nos saberes dos povos tradicionais e integra um projeto mais amplo de sociedade, “centrado na reprodução da vida”.

Para a Dra. Adil, a agroecologia é um “sopro de vida num cenário de falta de esperança e credibilidade nas instituições e nos processos coletivos”. Destaca, ainda, a necessidade de investimento na agricultura familiar e na agricultura nos territórios urbanos, que apesar de mais complexa vem crescendo ultimamente.

Destaca a Dra. Adil que, de acordo com abordagem adotada pela ABA – Associação Brasileira de Agroecologia, a agroecologia é ao mesmo tempo ciência, prática e movimento.

Ciência, porquantoestá ancorada na perspectiva inter-multi-transdisciplinar no campo acadêmico que dialoga com saberes populares, integrados com a natureza e a cultura local. Promove inovações metodológicas, no modo de fazer ciência e também deslocamentos da zona de conforto de cada campo científico, assim como do conhecimento hierarquizado. Destaca, nesse aspecto, a conquista de editais federais envolvendo diferentes ministérios para apoiar a criação e manutenção de Núcleos de Estudo em Agroecologia e Produção Orgânica (NEAs) e Redes desses Núcleos para atuarem em diferentes frentes de ensino-pesquisa-extensão, de forma indissociada.

Prática, porquanto incorpora as especificidades locais para potencializar os agroecossistemas em uma perspectiva produtiva de trabalhar com a natureza  e não contra ela. A gestão coletiva dos bens comuns também encontra-se presente na promoção da agroecologia nos territórios: agricultoras e agricultores experimentadoras/es criam tecnologias e instrumentos, integrando tradição e a inovação.

Movimento social, porquanto a agroecologia contesta a lógica injusta do agronegócio e da organização capitalista dos sistemas alimentares, que concentram terra, renda, se apropriam e esgotam bens comuns, promovem fome e desperdício de alimentos.

A pesquisadora destaca ainda várias iniciativas e redes existentes na RMBH e no Estado, que articulam diferentes atores e acumulam diagnósticos e propostas que valorizam as especificidades dos sujeitos e dos territórios mineiros.

Finaliza a Dra. Adil, ressaltando que, para a construção do Plano de CT&I para o Estado, deve-se considerar os apontamentos do seminário “Dialogar para transformar: diretrizes para o apoio à pesquisa em agroecologia, agricultura familiar e urbana e povos e comunidades tradicionais em Minas Gerais”, realizado em 2017.

 

Na visão da Dra. Andréa Zhouri

À Dra. Zhouri, havia sido solicitado que abordasse alternativas à exploração predatória dos recursos minerais do Estado. Todavia, para ela, não há que se falar em alternativas sustentáveis na mineração, porquanto essa atividade é sempre predatória, visto tratar-se da extração de recursos finitos e não renováveis. Na oportunidade, ela cita Gudynas (2015), para o qual a extração mineral é como uma “amputação ecológica”, pois após a mineração, por mais cuidadosa que seja realizada, não resta nada além de um “coto” no lugar: não nasce nada, nem surge outro minério no lugar.

Para Zhouri, não existem alternativas à exploração predatória de minérios, mas existem alternativas à mineração. Para isso, é preciso mudar o foco da discussão dos meios da mineração para os fins: de Mineral como? Para Minerar para quê e para quem? No foco atual, o meio ambiente é reduzido apenas a recursos minerais para serem comercializados, e a contribuição da mineração para o PIB mineiro é de apenas 2%.

Como exemplo, ela menciona a bacia do Rio Doce.  Apenas no Rio Santo Antônio já haveriam duas barragens hidrelétricas e duas barragens de mineração e ainda haveria propostas de construção de 20 PCHs (Pequenas Centrais Hidrelétricas) na bacia, como se lá não houvesse pessoas, vida, história e outros projetos de geração de renda, geralmente não abordados nos projetos de mineração.

Para Zhouri, a mineração é um setor muito voraz, que não se auto contém. Ele tem que ser contido pelo poder público. As empresas do setor têm a lógica da acumulação, do lucro e não se autorregulamenta. Cerca de 70% dos deputados estaduais da ALMG foram apoiados por mineradoras, o que dificulta a independência deles na regulamentação do setor. Ademais, a suposta participação da sociedade nos conselhos, audiências públicas e nos licenciamentos ambientais seriam pró-forma. Como exemplo, cita a aprovação da licença simplificada para mineração, onde as etapas do processo de licenciamento passam a ser concomitantes. Como consequência, aumenta-se a invisibilidade da realidade local sócio-ambiental, econômica e cultural, os ataques aos direitos das populações afetadas, a violência física, material simbólica e sistêmica e as audiências públicas performáticas.

Para minimizar os efeitos perversos da mineração é necessário o desenvolvimento de novas tecnologias sociais e políticas, centradas na democratização dos processos decisórios, desde o seu planejamento. É fundamental valorizar o princípio da equidade ambiental, o respeito às preferências locais, contemplando a possibilidade do não. São ainda necessárias instâncias deliberativas de fato

 

Questionamentos e debates com participação da audiência

O debate com a audiência foi muito rico, sendo aqui destacadas apenas alguns dos vários questionamentos dos participantes e considerações finais dos membros da mesa.

  • Teoricamente seria a comunidade local quem determinaria as normas e regras da mineração, mas, mesmo em outros países como na Argentina, o processo de consulta que leva frequentemente ao sequestro das representações locais, com o imediatismo da entrada de recursos nos territórios. (Marcos Antônio Vargas – UFF/ Fiocruz)
  • A expectativa da sociedade era que os Conselhos pudessem assumir um papel mais regulador, mas de fato sua composição, como está, não assegura a participação efetiva dos contrários. (Lileia Diotaiuti – Fiocruz)
  • A atividade de extração mineral é tão predatória quanto qualquer outra atividade econômica dentro do sistema capitalista que explora o homem e seu trabalho. A mineração, por exemplo, disputa com a construção e a agricultura quem destrói mais os territórios. (Cláudio Scliar – Apubh)
  • O Plano de CT&I para o Estado é para hoje e não pode esperar. A população precisa compreender melhor o processo para interferir nos caminhos do desenvolvimento. A diversidade do meio ambiente pode oferecer alternativas fantásticas à mineração. Há uma chance grande, mas a população também precisa mudar os seus hábitos: não dá para trocar de carro, celular e computador todo dia. (Geraldo Wilson – UFMG)
  • A agroecologia tem duas frentes: a da denúncia e a do anúncio. É necessário um comprometimento da comunidade cientifica com as pautas da sociedade. Onde está a pesquisa sobre a agricultura urbana? A agroecologia precisar ir para além da invisibilidade, inviabilidade e insignificância. De fato há uma economia invisível, como as pequenas produções agrícolas, que não entram no cálculo do PIB, e os impactos negativos das grandes produções, que também não entram no cômpito. O que seria mais pertinente para Minas Gerais: o quadrilátero ferrífero ou o quadrilátero aquífero? A interação da academia com a sociedade precisa ser de duas vias: é a universidade ir às ruas e praças, mas também trazer a diversidade para dentro dos muros das universidades. (Daniela Adil – AUÊ )
  • Estamos há mais de 40 anos de conferências de sustentabilidade, equidade e justiça ambiental e pouco avançamos. Estamos em hora de uma ruptura radical. Precisamos romper com certos paradigmas de colonização, de hegemonia branca e europeia de fazer ciência. Precisamos incorporar as experiências que estão sendo desenvolvidas nos territórios. Não dá mais para reduzirmos o discurso à mitigação e à compensação (Andréa Zhouri -UFMG).