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Governo publica decreto sobre fim de programa de escola cívico-militar

Nesta sexta-feira, o governo federal publicou finalmente o decreto 11.611, que revoga o decreto 10.004 de 2019, oficializando o fim do programa nacional das Escolas Cívico-militares (PECIM).  O decreto oficial foi publicado 11 dias após o ofício circular que anunciava aos secretários de educação, a decisão dos ministérios da Educação e da Defesa tomada após um processo de avaliação conduzida pelos dois ministérios e a secretaria de educação básica do MEC.

O Ofício Circular Nº 4/2023/COGEF/DPDI/SEB/SEB-MEC dizia que “a partir desta definição, iniciar-se-á um processo de desmobilização do pessoal das Forças Armadas envolvidos em sua implementação e lotado nas unidades educacionais vinculadas ao Programa, bem como a adoção gradual de medidas que possibilitem o encerramento do ano letivo dentro da normalidade necessária aos trabalhos e atividades educativas”.  O ofício ainda ressaltava que deveriam ser adotadas estratégias para reintegração das escolas ao sistema regular de ensino.  Já o decreto oficializa a recomendação e estabelece um prazo de 30 dias para o que o MEC apresente um plano de transição que, em seguida, deverá ser discutido com estados e municípios.

O decreto era uma reivindicação de pesquisadores, ex-funcionários do MEC e entidades de educação, pois o Ofício Circular Nº4/2023 encerrava em parte o PECIM. Foi o que alardeou a Associação Brasileira de Educação Cívico-militar (ABEMIL), também por meio de ofício,  conclamando prefeitos, governadores e o congresso a adotarem medidas para manutenção do ensino militar nas escolas civis. “É fundamental deixar claro que o projeto das escolas cívico-militares NÃO foi extinto. Simplesmente que não será mais manutenido pelos ministérios supra. Dessa forma, conclama-se todos os Deputados Federais, Senadores, Governadores e Prefeitos que mobilizem meios, informações e recursos humanos e financeiros para que tais escolas continuem a ser cívico-militares, atendendo, certamente, ao anseio e desejo de todas as comunidades escolares diretamente atingidas por tal decisão”.  Foi um apelo ouvido por munícipios e estados, em especial, aqueles cuja ideologia de ultradireita ainda dá à tônica das decisões dos governos locais. É o caso, por exemplo, de Minas Gerais cujo governador Romeu Zema, anunciou nas redes sociais a manutenção do PECIM, mas sob a responsabilidade do Corpo de Bombeiros. São Paulo e Rio de Janeiro também anunciaram a continuidade do programa.

Instituído em 2019 pelo Decreto 10.004/2019, do então presidente Jair Bolsonaro, o Programa Nacional das Escolas Cívico-militares tinha “a finalidade de promover a melhoria na qualidade da educação básica no ensino fundamental e no ensino médio”, conforme disposto no documento. Entretanto, de acordo com a integrante da Rede Nacional de Pesquisa em Militarização da Educação e professora da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB), Catarina de Almeida Santos, em entrevista para Agência Brasil, “o modelo cívico-militar não está em conformidade com a legislação educacional, que não prevê, em lei, a atuação de militares nas escolas”.

Além disso, notícia publicada pela Agência Brasil, cita a nota técnica assinada pelo Secretário Substituto de Educação Básica, Alexsandro Santos, na qual se “desaconselha a manutenção do programa por entender que há problemas de coesão/coerência normativa entre sua estrutura e os alicerces normativos do sistema educacional brasileiro. Além disso, induz o desvio de finalidade das atividades das forças armadas, “invocando sua atuação em uma seara que não é sua expertise e não é condizente com seu lugar institucional no ordenamento jurídico brasileiro”.

A referida nota técnica menciona ainda o baixo investimento orçamentário feito no PECIM  nos últimos três anos. Aliás, a redução drástica de investimentos em educação foi uma das marcas registradas do governo Bolsonaro. Foram quatro anos de um verdadeiro desmonte da educação brasileira em todos os níveis, desde o ensino fundamental e médio, até as universidades, com sucessivos cortes orçamentários, perseguição a docentes, redução de verbas para infraestrutura, segurança e alimentação. Somente na Educação básica, a redução  do orçamento para 2023 foi de de 97,1% em relação a 2022.

Neste sentido, cabe ainda o questionamento se o deslocamento de militares para as escolas cívico-militares  foi suficiente para resolver os problemas da educação no Brasil, que passam antes de tudo, pelo grave descaso com a educação no país, especialmente a pública. Para além disso, como resolver o problema da exclusão de alunos e docentes que não se adequaram ao modelo da disciplina militar no projeto educacional do PECIM?

Os problemas das escolas brasileiras são inerentes  a falta de infraestrutura adequada (bibliotecas, salas de aulas, salas de leitura, informática, laboratórios, coleta de lixo, banheiros, entre outros), além da observância legal quanto a destinação dos recursos públicos para a Educação brasileira. As situações acima  relatadas tendem a favorecer a evasão escolar, corroborada na maioria das vezes pelo impacto do desemprego, da fome, da falta de saneamento e da violência na vida das crianças e adolescentes. Questões estas que, para serem plenamente resolvidas, carecem de investimentos em políticas públicas sociais.

Após três anos de funcionamento, o PECIM funciona hoje em 216 escolas em 23 estados brasileiros e no Distrito Federal, com cerca de 200 mil alunos.