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De compras irregulares a supersalários, TCU investiga Forças Armadas no governo Bolsonaro

As Forças Armadas são uma fatia proeminente do eleitorado e da base de apoio do governo Bolsonaro. E não por acaso, o Poder Executivo, atualmente encabeçado por um capitão da reserva do Exército, tem dispensado atenção especial à ala militar. A função estratégica se mostrou, até mesmo, nas investidas bolsonaristas contra as instituições democráticas do Brasil. O presidente chegou a sugerir que o Exército promovesse uma contagem paralela da votação do pleito deste ano, apesar de não ser papel das Forças Armadas tutelar o processo eleitoral.

Enquanto o governo Bolsonaro continua a emitir acusações infundadas, baseadas em informações falsas já desmentidas por especialistas e órgãos competentes, militares insistem na realização de uma “apuração paralela”. Neste contexto, o Tribunal de Contas da União (TCU) detalhou, esta semana, a parceria firmada com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para auditar mais de 4 mil urnas eletrônicas. Embora tenha sido negado por porta-vozes da Corte, a atitude foi tomada como uma resposta às Forças Armadas. Assim, a auditoria do TCU teria condições de estabelecer um contraponto a eventuais questionamentos.

O TCU também tem tido papel de destaque para averiguar parte da série de escândalos envolvendo o favorecimento do governo Bolsonaro às Forças Armadas, nos últimos anos. Recentemente, veio à tona a suspeita de que legislação militar, implementada pelo governo Bolsonaro, estaria sendo usada para o favorecimento de integrantes do alto comando de Forças Armadas. As informações foram divulgadas em reportagem de André Borges, publicada pelo jornal Estadão. O caso estaria ocorrendo através do “adicional de habilitação”, que garante um acréscimo de até 66% nos vencimentos de militares, após concluírem cursos de “aperfeiçoamento”. Cinco categorias podem ser beneficiadas com a realização dessa capacitação, sendo que os maiores valores são disponibilizados nas duas categorias de “Altos Estudos”.

Porém, se observou a alta incidência de militares que se aposentaram, logo após concluírem essa capacitação. Ou seja, o aperfeiçoamento não teria motivações práticas para o exercício de suas funções, mas serviria somente como uma brecha para elevar os rendimentos de militares prestes a irem para a reserva. E isso é possível por causa da reforma da previdência de militares, assinada no primeiro ano do governo Bolsonaro. De acordo com dados oficiais do Ministério da Defesa, dos 4.349 oficiais e suboficiais da Marinha que passaram por este treinamento, 1.932 já se aposentaram (48% do total). A Marinha é, justamente, onde mais se concentram ocorrências semelhantes à explicada acima.

Diante dessa situação, o Tribunal de Contas da União (TCU) acolheu o pedido, feito pelo deputado Elias Vaz (PSB/GO), para apurar um possível caso de favorecimento de integrantes do alto comando de Forças Armadas, na Marinha e na Aeronáutica. Para se ter noção do impacto para os cofres públicos, a reportagem do Estadão levantou o aumento percentual nos soldos de militares da Marinha que fazem parte da categoria 1 de “Altos Estudos”. Antes do governo Bolsonaro, o adicional de habilitação gerava um aumento 30% no soldo desses militares. Já em 2021, o percentual subiu para 54%, sendo a perspectiva que, no ano que vem, suba para 73%.

O TCU também realizará auditoria em três Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (PDP), firmadas entre as Forças armadas e o Ministério da Saúde. As PDPs são políticas de Estado, através das quais a União contribui com o aprimoramento de laboratórios públicos e o custeio do desenvolvimento de medicamentos de interesse da população. Essa proposta de desenvolvimento científico é, em si, um investimento necessário. Contudo, existe há indícios de que medicamentos estariam sendo adquiridos de forma irregular, por meio da parceria. A suspeita é de que esse seria o esquema para as compras milionárias, por parte de Forças Armadas, de 35 mil comprimidos de Viagra, 60 próteses penianas infláveis e remédios para calvície. Com a investigação, a Corte atende ao pedido feito pelos deputados Áureo Ribeiro (Solidariedade-RJ), 1º vice-presidente da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara, e Jorge Solla (PT-BA).

O favorecimento do governo Bolsonaro aos militares, contudo, não para por aí. De acordo com relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), publicado em 2021, o governo estaria empregando 6.175 militares em cargos na administração pública federal. O número é mais do que o dobro do registro na gestão anterior, quando membros das forças armadas ocupavam 2.765 dessas funções. Entre tantos outros exemplos de favorecimento, podemos citar os supersalários de militares que, com os benefícios concedidos pelo atual governo, chegam a superar R$ 1 milhão em apenas um mês. Vide o caso do general Walter Braga Netto, que ocupa o cargo de vice-presidente na chapa de Bolsonaro. De acordo com dados do Portal da Transparência, apurados pelo jornal O Estado de S. Paulo, o general recebeu R$ 926 mil, somado o período entre março e junho de 2020.

A cada dia, se torna mais evidente a maneira como o governo Bolsonaro usa a máquina pública em benefício próprio. Os benefícios concedidos à parcela militar do funcionalismo público diferem, absurdamente, do sucateamento da carreira a que são sujeitados os servidores públicos federais. A reforma da Previdência das Forças Armadas garante condições que em nada se comparam com à situação paupérrima condicionada à classe trabalhadora, por meio da “reforma” da Previdência (EC 103). Enquanto enfrenta os efeitos de uma profunda crise sanitária, econômica e política, a população acompanha esquemas de troca de favores de e favorecimento de aliados. E assim, o governo que assumiu a presidência da República com promessas de combate à corrupção e os privilégios, revela sua verdadeira face.