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A demissão da primeira professora trans do IFCE e o aspecto estrutural da transfobia

Suspeitas de arbitrariedade, de irregularidade e, até mesmo, de transfobia envolvem o Processo Administrativo Disciplinar (PAD) que levou à exoneração da professora Êmy Virgínia Oliveira da Costa. Primeira professora transexual a ocupar um cargo de docência no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), a professora Êmy relatou que assédios e perseguições fizeram parte de sua rotina desde sua entrada na instituição.

Segundo nota do IFCE, a demissão foi motivada pelos 78 dias intercalados que a professora esteve ausente da instituição. Período esse em que a docente esteve no Uruguai, cumprindo as atividades do doutorado na Universidad de la República. No entanto, a punição contrasta com o fato da ausência ter sido autorizada pela Comissão Permanente de Pessoal Docente (CPPD) do instituto e pelo colegiado de curso, além de ser do conhecimento dos outros setores do IFCE. Ademais, para evitar prejuízos para a disciplina ministrada pela professora, as aulas foram antecipadas. Algo que, inclusive, foi de pleno acordo dos estudantes.

Êmy Virgínia também discorda do cálculo de dias feito pela instituição. De acordo com ela, para chegar a esse número, a instituição teria contabilizado, até mesmo, sábados, domingos e feriados. Ainda por cima, há conhecimento de diversos casos semelhantes registrados na instituição, que não receberam a mesma punição. Assim, o tratamento diferenciado, levanta dúvidas quanto às razões que levaram a tamanho rigor punitivo, justamente, nessa ocorrência.

A situação causou indignação da comunidade do IFCE. Docentes, estudantes e TAEs da instituição usaram as redes sociais para demonstrar apoio à professora, além de atestar a qualidade do trabalho prestado pela servidora pública. Demonstrando o papel do movimento sindical para resguardar os direitos da classe trabalhadora, o Sindicato dos Servidores do IFCE (SINDSIFCE) atua juridicamente para anular o efeito da decisão.

Estamos a poucos dias de 29 de janeiro, data em que o Brasil celebra o Dia da Visibilidade Trans. O direito pleno à liberdade de orientação de gênero e diversidade sexual, contudo, ainda está longe de ser uma realidade para garantia dos direitos humanos no Brasil. Ainda persiste o preconceito estrutural contra pessoas que não se enquadram na heterocisnormatividade.

Cabe lembrar que estamos no país que mais mata pessoas trans e travestis no mundo. Apenas em 2022, foram 131 assassinatos. Com isso, o Brasil ocupou o topo desse ranking preocupante pelo 14º ano consecutivo. Os números alarmantes constam no “Dossiê assassinatos e violências contra travestis e transexuais brasileiras”, publicado no início do ano passado pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA).

As violências, no entanto, não se limitam às agressões físicas. Cotidianamente, essa parcela da população enfrenta impedimentos para ocupar espaços de formação, trabalho e lazer. E demonstrando o caráter estrutural dessa forma de segregação, até mesmo dispositivos administrativos podem ser usados como ferramentas de exclusão. Algo que, ao que tudo indica, pode ter ocorrido na controversa demissão da professora Êmy Virgínia. Em outras palavras, sob uma fachada de legalidade e isenção, o preconceito é reafirmado.

Nós, da Diretoria do APUBHFMG+, manifestamos a nossa solidariedade à professora Êmy Virgínia Oliveira da Costa. Casos como esse precisam ser expostos, para que ocorra a devida apuração, assim como que as medidas cabíveis sejam tomadas. Torna-se urgente a necessidade de ampliar o debate sobre os aspectos estruturais da transfobia em ambientes de educação. Não podemos nos calar diante de suspeitas de preconceito, sejam quais forem as formas que assumam.

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