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20 anos do Dia da Visibilidade Trans no Brasil: pelo 15º ano consecutivo, o país lidera o ranking mundial de quem mais mata pessoas trans

O Dia da Visibilidade Trans foi celebrado nesta segunda-feira (29/01) em Brasília. A data foi instaurada em 2004 pelo Ministério da Saúde no Congresso Nacional por meio da campanha “Travesti e Respeito”. Sendo comemorada pela vigésima vez, o dia da visibilidade trans tem o objetivo de promover a visibilidade na luta e na consciência sobre os direitos da categoria.

Embora o dia é de comemoração, há ainda muito a se conquistar, pois segundo a Associação de Travestis e Transexuais (ANTRA) o Brasil figura no primeiro lugar do ranking de países que mais matam pessoas trans no mundo, pelo 15° ano consecutivo. Em 2022 houveram 131 casos de assassinatos no Brasil, enquanto em 2023 o índice subiu 10,7% com 155 mortes de pessoas travestis e transexuais. A expectativa de vida de pessoas transgênero no Brasil é de até 35 anos de idade. Para Bruna Benevides, secretária de Articulação Política da ANTRA, a “comunidade ainda não tem assegurado o direito à vida plenamente no Brasil. Isso é muito grave! Porque se nos temos uma violência sistemática que alcança a nossa comunidade, como é que a gente vai pensar em outras políticas públicas?”. O 7º dossiê “Assassinatos e violências contra travestis e transexuais brasileiras”, divulgado pela ANTRA, relatou que 72% das vítimas assassinadas no país eram pessoas pretas ou pardas e pobres, e também afirmou que pessoas trans que não passam por mudanças corporais não sofrem os mesmos tipos de violência, pois não entram em um embate direto com a sociedade heteronormativa e cisgênera. Esse dossiê tem como propósito trazer visibilidade à causa, apontando os dados e pesquisas sobre pessoas trans e contribuindo para o acesso à informação sobre a transfobia, travestifobia e o transfeminicídio, para que a sociedade se conscientize e exija ações afirmativas para uma melhoria nos direitos, na inclusão e em uma vida digna às pessoas trans.

 

Contexto social e educação

No contexto social, a principal fonte de renda de pessoas travestis e transexuais vem da prostituição e por estarem nessa posição marginalizada, estão expostas a uma violência direta e, consequentemente, segundo os dados da ANTRA, 57% dos assassinatos são de pessoas trans que trabalham com sexo.

No que diz respeito à educação, cerca de 70% não concluíram o ensino médio e só 0,02% tiveram acesso ao ensino superior. Isso se deve à recorrente evasão e invisibilidade de pessoas trans na sociedade e também no ambiente escolar. Esse ambiente compactua com a perpetuação da transfobia e com o higienismo social, fazendo com que as pessoas trans abandonem os estudos – cerca de 82% das pessoas trans e travestis abandonaram os estudos ainda na educação básica. Assim, se ergue uma nova fronteira para o acesso ao mercado de trabalho onde apenas 10% das pessoas trans ocupam o mercado formal/tradicional.

 

Cotas destinadas a pessoas trans

 

Entre 2018 e 2021, cinco universidades públicas do país aprovaram cotas para pessoas travestis e transexuais na graduação. A pioneira foi a Universidade Estadual da Bahia (UNEB), em 2018, destinando o maior número de vagas: 123 pelo SISU e 223 pelo vestibular tradicional, somando 346 vagas. Segundo a ANTRA, por mais que um dos caminhos já tenha sido trilhado, ainda se encontram muitos obstáculos para a inclusão nesses espaços.

A deputada Erika Hilton (PSOL-SP), em julho de 2023, criou um projeto para implementar cotas nas Universidades Federais para travestis e transexuais. No projeto, é previsto que 5% das vagas sejam destinadas em cada curso de graduação.

 

Professora do IFCE demitida injustamente

 

No dia 05 de janeiro de 2024 foi assinado um pedido de demissão de Êmy Virgínia Oliveira da Costa, professora trans do IFCE (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará), pelo Reitor Substituto. O Processo Administrativo Disciplinar (PAD) aconteceu enquanto a docente ainda trabalhava no IFCE, no campus Tianguá-CE, com a justificativa de que a professora antecipou suas aulas para comparecer ao curso de Doutorado em Linguística, na Universidad de la República no Uruguai, enquanto ainda esperava pela aprovação de seu pedido. Antes de executar o pedido de afastamento, Êmy solicitou uma autorização para reorganizar suas aulas e atividades, o que foi aceito pela instituição. Para continuar mais um período de estudos, Êmy enviou um novo pedido para a instituição para se ausentar do país. Novamente, não houveram respostas nem positivas ou negativas a respeito do pedido a tempo da viagem. A resposta foi efetuada dois anos depois, pela própria Comissão do PAD.

Mesmo com todos os registros das aulas e todo o processo legal efetuado pela professora, o IFCE abriu o PAD contra Êmy que ocasionou sua desistência do curso de Doutorado e um adoecimento mental. Após todo negacionismo acerca das irregularidades cometidas na tramitação do processo contra a servidora, a Reitoria decidiu também que a professora não deve mais ser servidora pública, que tem 20 anos de trajetória na educação pública, sendo 7 deles no IFCE.

Segundo o SINASEFE (Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica), que prestou solidariedade a servidora, o tipo de tratamento a que a professora Êmy foi submetida é desigual, se comparado com o que é dispensado a outros servidores, visto que casos como esses são comuns e parecidos dentro da instituição, levando a concluir que a professora sofreu transfobia, assédio e perseguição, métodos comuns dentro da gestão do IFCE..

 

Pelo direito à diversidade de existir

 

A luta pelos direitos de pessoas da comunidade LGBTQIAPN+ que vivem no país mais violento do mundo para esta categoria de pessoas é uma batalha de toda sociedade. São necessárias ações efetivas através de ações afirmativas e políticas públicas por meio da realização de leis que assegurem sua existência e sua inclusão no acesso e permanência na comunidade.

A homofobia e a transfobia podem ser superadas, principalmente, se forem praticadas discussões e debates desde a educação fundamental a educação superior com o devido e adequado  acesso à informação, para que a educação desempenhe um papel sólido contra a exclusão de pessoas trans e, assim, impulsione no espaço escolar, um ambiente não só de permanência, mas também de pertencimento para pessoas travestis e transexuais, tendo em vista  garantir o direito do outro existir.

É necessário estarmos atentos para repararmos historicamente o triste cenário onde a falta de informação sobre pessoas trans alimenta engrenagens de um sistema conservador que  mantem uma necropolítica que negligencia o direito de pessoas trans a estarem vivas e terem uma vida digna.

Fonte: https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2024-01/luta-pela-visibilidade-trans-reune-ativistas-em-brasilia