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O desmonte da pesquisa científica brasileira em números

Entre 2014 e 2021, 12.473 estudantes ficaram sem bolsa de pesquisa do Governo Federal.  O montante é maior do que a população de Tiradentes, cidade mineira com cerca de 8.160 habitantes. Os números foram trazidos à tona na matéria “Pesquisa científica na penúria”, publicada pela revista Piauí, que realizou um panorama da diminuição de investimentos federais no setor. Os dados reforçam a necessidade de levantar a bandeira da valorização da pesquisa e desenvolvimento científico, sobretudo após anos de uma política de Estado de desmonte.

Vale lembrar, inclusive, que no próximo sábado, 11 de fevereiro, é celebrado o Dia Internacional de Mulheres e Meninas na Ciência. A data chega em um momento especial para a área de CT&I no Brasil – afinal, pela primeira vez, uma mulher está à frente do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Instituída pela UNESCO como forma de debater e incentivar a inserção feminina na área, a data mantém sua relevância, ainda mais neste momento, em que as condições de trabalho nessa área são afetadas pela falta de verbas.

Nesse sentido, a ministra Luciana Santos, que está à frente do MCTI, assegurou que as bolsas de pesquisa científica terão reajuste, ainda no primeiro semestre deste ano. A fala ocorreu, no dia 2 de fevereiro, em seu discurso na 13º Bienal da União Nacional dos Estudantes (UNE). Inclusive, em 26 de janeiro, a Associação Nacional dos Pós-Graduandos do Brasil (ANPG) entregou abaixo-assinado para o ministro da Educação, Camilo Santana, em que defende o reajuste das bolsas de pós-graduação. O documento foi assinado por mais de 120 mil pessoas.

Se efetivado, o reajuste trará um novo fôlego para o setor, que vem respirando por aparelhos nos últimos anos. E a população, por sua vez, poderá contar com os benefícios gerados pelo desenvolvimento científico, como ocorreu com as contribuições de cientistas brasileiros no combate à pandemia de Covid-19.

Outro dado levantado pela revista Piauí diz respeito às bolsas de doutorandos da CAPES. A partir de números do Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (CONFAP), a reportagem apurou que, em 2020, apenas 46.100 dos 124.530 doutorandos do país receberam o benefício do órgão. Ou seja, apenas 3 a cada 10 pesquisadores. Um percentual menor do que o registrado em 2015, quando a bolsa contemplava 42% dos 102 mil doutorandos.

E além da queda do número de bolsas, também é preciso estar atento à falta de reajuste do benefício. Para se ter uma noção da situação, em 2013, uma cesta básica (conforme os cálculos do DIESSE) equivalia a um quinto da bolsa de mestrado paga pela CAPES. Já em 2022, equivale à metade do benefício.

Além disso, o cenário também é grave, se considerarmos o valor da bolsa em relação ao valor ideal para o salário mínimo, de acordo com os cálculos do DIEESE. A última vez em que estes dois valores estiveram em equilíbrio foi há 22 anos, em agosto de 2001. Na época, o valor do salário ideal seria R$ 1.070, e os doutorandos recebiam uma bolsa de R$ 1073. Atualmente, esses estudantes recebem R$ 2.200, sendo que o salário em 2022, segundo o Dieese, deveria ser de R$ 6.299.

A falta de investimento em bolsas de iniciação científica afeta, diretamente, as condições para o desenvolvimento da pesquisa no país. Afinal, o trabalho é desenvolvido por estas pesquisadoras e pesquisadores, que têm as suas condições de sustento comprometido pela diminuição da disponibilidade e pela defasagem do valor das bolsas.

Assim, os números demonstram, na prática, como o processo de desmonte da pesquisa científica brasileira foi colocado em prática, nos últimos anos. E por outro lado, não podemos esquecer os contínuos cortes/contingenciamentos na Universidade Pública, a principal produtora de Ciência no Brasil, assim como o sucateamento da carreira das pessoas que trabalham nessas instituições. A luta pela sobrevivência da área de CT&I, portanto, não pode ter trégua. Se acreditamos no papel da produção de conhecimento socialmente reverenciada, inclusiva e que se reverta em benefícios para a sociedade, a nossa mobilização precisa continuar.