Acontece no APUBH

Rombo bilionário das Americanas S.A. causou prejuízo à FUNPRESP

Tão logo foi confirmado o resultado das eleições presidenciais do ano passado, começamos a ver reações negativas do “Mercado” sobre as propostas do governo Lula para a economia. Passado o primeiro mês da nova gestão, os indicadores econômicos tiveram melhora. O principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo, o Ibovespa, teve aumento de 3,37%. Já o dólar comercial passou de R$ 5,28 para R$ 5,08. Longe de garantir uma reação positiva de investidores, contudo, esse cenário apenas confirma tendências de rentista e da elite financeira. A superação das desigualdades não está na agenda do mercado financeiro. Na verdade, o setor tem a impressão digital do projeto neoliberal que aprofundou a miséria no Brasil. Além do que, o setor financeiro tende a ser instável, seguindo o fluxo das relações comerciais.

Vejamos o caso do grupo Americanas S.A., que continua envolto, desde o início do ano, em um escândalo bilionário. Uma das maiores varejistas do país, a empresa entrou com um pedido de recuperação judicial, por causa de uma dívida de cerca de R$ 43 bilhões. Com o pretexto de “inconsistências em lançamentos contábeis”, o grupo pegou credores e investidores de surpresa, causando o receio de calote. Além do que, as circunstâncias do caso têm alimentado suspeitas de fraude.

Entre os afetados, está, até mesmo, o funcionalismo público federal. Acontece que a Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal do Poder Executivo (FUNPRESP-EXE) teve uma perda de 77% do valor investido, o que equivale a R$ 11,576 milhões, de acordo com dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (ANBIMA).

Em funcionamento desde 04 de fevereiro de 2013, a FUNPRESP-Exe funciona como um fundo para operacionalizar o Regime de Previdência Complementar (RPC). No entanto, parte das reservas do fundo é investido em aplicações – e como é próprio dos investimentos no mercado financeiro, não há garantias para os servidores públicos que fizeram a opção pela FUNPRESP como previdência complementar, do retorno do valor empregado. E é, justamente, a maneira como esse fundo é administrado que o envolveu na crise financeira das Lojas Americanas.

Até o final do ano passado, a FUNPRESP-Exe possuía um patrimônio de R$ 6,49 bilhões, dos quais R$ 4,49 bilhões (69%) são geridos pela própria fundação. Já o restante, R$ 2 bilhões (31%), são administrados por terceiros, por meio da atividade conhecida como asset management [“gestão de ativos”, em tradução livre]. Assim, através dessa gestão terceirizada, a FUNPRESP-Exe investiu R$ 15,040 milhões em debêntures – ou seja, uma forma de título de crédito. Desse montante, 6 milhões diziam respeito às Lojas Americanas (LAMEA6), por meio do fundo exclusivo de crédito do Santander, totalizando R$ 7,048 milhões. E outras 6.840 debêntures das Lojas Americanas e SubMarino (LAMEA6 e BTOW15), por meio do fundo exclusivo de crédito do Daycoval, no valor de R$ 7,992 milhões.

As trabalhadoras e trabalhadores que ingressaram no serviço público após a criação FUNPRESP-Exe foram incluídos, automaticamente, no RCP. Já quem ingressou anteriormente pôde escolher entre migrar ou não para esse novo regime. Em 2019, na ocasião do final do prazo para a escolha desta adesão, a Diretoria do APUBHUFMG+ desaconselhou a migração, sobretudo para quem possuía mais tempo no Setor Público. Como dito na época, apesar da aparente vantagem imediata, a adesão significava, no mínimo assumir riscos, , uma vez que a mudança para o RPC poderia acarretar em riscos financeiros, bem como em perda de futuros benefícios.

O RPC é previsto pela Emenda Constitucional nº 20/98 como um regime privado, facultativo, e organizado na forma aberta (gerenciado, por exemplo, por bancos e seguradoras) ou fechada (fundos de pensão). Seu objetivo é constituir reservas pecuniárias, e seu sustento vem de investimentos feitos no mercado financeiro. O benefício não é definido – é dependente do sucesso (ou insucesso) dos investimentos com o dinheiro aplicado, sem a certeza de seu recebimento. Assim, o Estado não poderá cobrir rombo de eventuais prejuízos que existirem nas aplicações.

Embora o Regime de Previdência Complementar – RPC seja obrigatório para os servidores federais que ingressaram na carreira a partir do início de sua vigência (em 04.02.2013), é facultativo para os servidores que ingressaram antes desta data.

O prazo para adesão, com garantia de pagamento de benefício especial, para os servidores federais que ingressaram no serviço público antes de 04.02.2013, foi prorrogado para o dia 30 de novembro de 2022, pela Medida Provisória nº 1.119/2022. No ano de 2022, a FUNPRESP-Exe abriu um novo prazo para adesão ao fundo até o dia 30 de novembro de 2022, buscando com isso aumentar as adesões ao fundo.

Na semana passada, no dia 24 de janeiro, a instituição da Previdência Social no Brasil completou 100 anos. O APUBHUFMG+ repercutiu a data, reforçando que a aposentadoria é um direito social conquistado pela classe trabalhadora. E na esteira da derrota nas urnas do projeto neoliberal que propôs e conseguiu aprovar a “reforma” da Previdência (EC 103/2019), evidenciamos a necessidade de luta pela derrubada da medida e pela recomposição das políticas públicas previdenciárias.

Agora, acompanhamos uma crise no mercado financeiro que afeta diretamente o fundo destinado a garantir o acesso de parte de nossa categoria ao direito à aposentadoria. O escândalo reacende o debate sobre a necessidade de discutir a implementação de uma previdência pública que seja, de fato, sólida e solidária. Afinal, para garantir uma aposentadoria digna e justa para cada pessoa trabalhadora, não podemos estar à mercê das especulações e dos interesses do mercado, que sempre foi avesso aos direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras. A história do movimento sindical confirma como a conquista, manutenção e ampliação dos direitos da classe trabalhadora sempre veio da nossa capacidade de mobilização e luta.

 

Saiba mais:

APUBHUFMG+: Nota Jurídica sobre o caso FUNPRESP e as Americanas S/A

DIEESE: O caso das Americanas S.A. e potenciais impactos para os trabalhadores e o sistema financeiro brasileiro