III Semana Negra do APUBH: “Viver a experiência política e poética da liberdade”
Mesa de encerramento do ciclo de debates, promovido pelo sindicato, abordou a ancestralidade cultural e religiosa afro-brasileira como ponto de partida para a construção de uma epistemologia alternativa para a educação no país.
“Cadê o povo preto que faz mestrado, que faz doutorado, que faz pesquisa? Cadê a gente na Ciência? Cadê a gente no ensino e na educação superior? Cadê a gente, é só na extensão? É só ali que vamos encontrar docentes negros e negras? Vamos pensar um pouco isso. E é em função de pensar essa e outras questões, que o APUBH fez essa semana”, refletiu a professora Analise da Silva, docente da Faculdade de Educação (FaE/UFMG) e vice-presidenta do APUBH UFMG+, na mesa de encerramento da III Semana Negra do APUBH.
Entre os dias 22 e 26 de novembro, o sindicato promoveu um ciclo de lives, com membros da comunidade acadêmica e de movimentos sociais para debater a presença de negros e negras na universidade pública, as questões que afetam a formação escolar dessa população, em seus diferentes âmbitos, e as experiências de ensino e prática da cultura de origem africana no país. A programação integrou o Novembro Negro da UFMG – Vozes e corpos que se afirmam.
Precisamos dar sequência à discussão e aprofundamento sobre as temáticas abordadas, para que possamos construir, coletivamente, alternativas de intervir sobre a nossa realidade, observou a professora. Os debates da III Semana Negra do APUBH estão disponíveis, no canal do sindicato no Youtube. Assista, comente e divulgue entre as suas e os seus colegas: https://cutt.ly/jT5aYyF
“Outras possibilidades de existir e de resistir”
Na noite da sexta-feira passada (26/11), o APUBH UFMG+ recebeu a professora Telma Borges, do Departamento de Métodos e Técnicas da Faculdade de Educação (FaE/UFMG), para conversar sobre o tema “Axé e Exú: potências criativas da encruzilhada”. A proposta da mesa partiu do trabalho de pesquisa desenvolvido pela professora, que propõe a construção de uma nova forma de pensar a educação e outras epistemologias, a partir da ancestralidade cultural e religiosa afro-brasileira.
O estudante Lucas Tiago, graduando no curso de Relações Públicas da UFMG, conduziu a conversa. Ao longo de suas participações nas lives, o estudante reforçou a importância de “levar essas discussões além do Novembro Negro, levar esse tipo de conteúdo durante todo o ano. Nós precisamos falar sobre as questões raciais e sobre essas potências, não só nesses espaços e nesse período”. Essa live, continua disponível no Canal do APUBH UFMG+: https://youtu.be/lICTGJMxdbc
A professora Telma Borges colocou em debate, em sua exposição, o modelo de ensino implementado no país, que reproduz o discurso da classe dominante e, assim, compactua com o seu projeto colonizador. Nesse sentido, a escola acaba por contribuir para a perpetuação do racismo estrutural no país. Realidade esta que vem sendo, inclusive, aprofundada, devido ao fortalecimento do conservadorismo, que propaga o preconceito étnico e comportamental, e do ultraliberalismo, que aumenta as desigualdades sociais. “O universo colonial e o discurso produzido por ele tentam, o tempo todo, apagar a nossa existência e, inclusive, as nossas produções de natureza cultural e religiosa, do encontro dessas duas potências como possibilidade da gente existir e resistir, confrontar e combater”, explicou a docente.
E como fazer frente a esta realidade, amplamente enraizada em nossa sociedade e que encontra, na educação, uma forma de perpetuação? Para a professora, é necessário desconstruir e reconstruir as teorias e práticas da educação brasileira, buscando um meio de se opor à exclusão gerada por este modelo de ensino. Em outras palavras, ela propõe que é preciso “deseducar”.
A pesquisadora encontrou na mitologia e nas tradições da cultura Yorubá a potencialidade para construir e trilhar uma alternativa à educação colonizadora. Ela apresentou a pedagogia da encruzilhada, como uma forma de pensar o ensino e aprendizagem e a produção de conhecimento, uma epistemologia que abre espaço para “outras possibilidades de existir e de resistir”. “A pedagogia das encruzilhadas vai propor essa ‘deseducação’ para que possamos viver a experiência política e poética da liberdade. Aqui, em dimensão utópica, mas em tempos distópicos, a gente precisa forjar caminhos para a utopia”, definiu a professora Telma.
A professora pontuou essa forma de construção de saberes, embasada pela literatura acadêmica produzida a esse respeito. “Num sentido muito parecido com o que dizemos sobre a ancestralidade, são esses que vieram antes de mim, na tentativa de pavimentar o caminho para que eu pudesse estar aqui hoje, falando sobre esse tema para vocês. Então, nesse sentido, esses autores, que eu dou visibilidade agora, e outros que vieram e estão aqui comigo vão constituir a minha ancestralidade acadêmica, nessa incursão inicial pelas pedagogias da encruzilhada”, definiu a professora.
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