Acontece no APUBH

10 anos das cotas raciais, e agora?

As políticas de ações afirmativas na Universidade foram discutidas no penúltimo dia da III Semana Negra do APUBH

 De 2012 para cá, muita coisa mudou nas Universidades devido à política de cotas raciais. Para aprofundar nesta discussão, o APUBH trouxe o tema para sua III Semana Negra na live intitulada “10 anos das cotas raciais, e agora?”, realizada na noite de ontem, 25/11, em parceria com o Centro de Convivência Negra (CCN).  “Eu acredito que é pela luta que as políticas de ações afirmativas vão sobreviver. Sobreviver ao conservadorismo, a esse novo sistema governamental de genocídio, de necropolítica que a gente vem vivendo. Então é isso, eu acredito que é pela coletividade que a gente vai conseguir avançar”, afirmou Silvia Regina, Mestre e doutoranda em Educação pela FaE/UFMG, com recorte nas temáticas relacionadas às questões das desigualdades raciais e políticas de ações afirmativas.

Com a mediação de Lucas Tiago, a mesa contou ainda com a participação de Karina Pereira, psicóloga graduada pela PUC Minas e mestra em Psicologia Social pela UFMG. Assista a live no Canal do APUBH UFMG+:  https://youtu.be/ajWydio6W2M

Durante a live, as convidadas apresentaram um panorama geral da Lei de Cotas e discutiram os impactos das cotas sócio-raciais na realidade dos estudantes e docentes. Ambas fazem parte dos programas de ações afirmativas da pós-graduação da UFMG. Destacamos alguns pontos levantados pelas pesquisadoras:

 

Entrar, Enegrecer!

 “A lei de cotas mudou o cenário estudantil das universidades públicas brasileiras tanto no que diz respeito ao público estudantil quanto com relação às questões, às desigualdades iniciais. E isso tem uma série de implicações que estão registradas em diversos trabalhos sobre cotas, das políticas de ações afirmativas, das desigualdades raciais no ensino superior”, explicou Sílvia Regina. Ela ainda informou que contabilizou 94 trabalhos somente nos últimos 5 anos sobre a temática.

 A pesquisadora falou ainda sobre as possibilidades de reflexão do tema no cenário atual diante “dos avanços e desafios sobre a questão legislativa dos projetos de lei que estão tramitando no Congresso Nacional que são favoráveis e contrárias à lei de cotas”. Neste sentido, ela ressaltou a importância de observar a reação da sociedade frente à demanda das cotas, considerando-se que em agosto de 2022 a lei completa 10 anos e é importante que ela permaneça.

Sílvia Regina chamou atenção para o significado da lei de cotas. “A lei 12711, conhecida como lei de cotas, é uma lei que trata da reserva de 50% das vagas para estudantes das escolas públicas, dentre esses 50% para estudantes de famílias com renda de até 1 salário e meio per capita e para estudantes pardos, pretos, indígenas e com deficiência dividido proporcionalmente de acordo com a população de cada estado”, explicou. De acordo com ela, a lei atende critérios sociais (desigualdade econômica) e critérios raciais. “Então ela não trata apenas de cotas raciais. É importante falar isso, porque o que incomoda na sociedade é o critério racial”, pontuou.

Ainda falando da lei de cotas, Silvia Regina lembrou que ela compreende as políticas de ações afirmativas. “E para produção, construção das políticas de ação afirmativa é importante falar da atuação do movimento negro. O movimento negro foi um importante ator na materialização do discurso e dessa realidade das ações afirmativas que a gente vive”, destacou.


Permanecer, esse lugar não é seu nem por um segundo!

 

“Eu queria trazer uma reflexão pra gente pensar que ação afirmativa está pra além da lei. Está pra além da entrada. Pensar como a universidade se compromete a criar mais possibilidades de circulação, de permanência material por meio de uma distribuição mais equânime de bolsas. Como a universidade se compromete com os editais para que eles sejam mais democráticos e para que estudantes cotistas circulam não só pelo ensino. Acessem não só ensino, mas a pesquisa, a extensão, e todos os universos, as portas que essas experiências podem abrir”. Foi com essa fala que Karina Pereira, psicóloga graduada pela PUC Minas e mestra em Psicologia Social pela UFMG iniciou a sua participação na live.

Neste sentido, Karina levantou uma reflexão sobre como ao entrar na universidade “não se deixar ser ferido de morte pelo epistemicídio. Pensando o epistemicídio na dimensão do acesso e da permanência. Como se faz para sobreviver para além da assistência estudantil e da permanência material, mas também da permanência simbólica, mas também da sobrevivência e circulação diante de tantas violências racistas que existem ainda nesse espaço”.

A entrada na faculdade por muitas vezes se torna apenas o primeiro desafio da vida universitária de jovens negras e negros. Karina exemplifica a situação do “negro único”, resultado da solidão e isolamento que os alunos sentem uma vez que são os únicos ou um dos poucos estudantes de pele negra nos espaços acadêmicos. A permanência estudantil também é um grande problema a ser enfrentado pelos discentes. Sustentar os gastos com alimentação, transporte, moradia e materiais de estudo e ainda conciliar com as tarefas acadêmicas e profissionais torna a estadia na universidade ainda mais complicada para muitos desses alunos.

A luta segue!

Em 2022, a Lei de Cotas será revisada e pode ser renovada ou alterada. Precisamos acompanhar de perto essa discussão, ocupar os locais de debate e pressionar nossos representantes pela defesa das cotas sócio-raciais. Os avanços alcançados graças a esse sistema ainda serão vistos por vários anos e não podemos permitir a extinção de um dos maiores meios de acesso à Universidade Pública para jovens negros e periféricos! Seguiremos juntos na luta por uma universidade pública, gratuita, de qualidade e para todos!