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Lives do APUBH debateram o sofrimento de mulheres e docentes, em tempos de pandemia

Atividades integraram a 8ª Semana de Saúde Mental da UFMG. Vídeos continuam disponíveis no Canal do Sindicato no Youtube

O sofrimento feminino em tempos de pandemia foi debatido pelas professoras Marlise Miriam de Matos Almeida e Diva Moreira, com a mediação da professora Maria Stella Brandão Goulart, presidenta do APUBH UFMG+. | Imagem: Reprodução.

Integrando a campanha “Coronavírus se combate com o SUS” e a 8ª Semana de Saúde Mental da UFMG, o APUBH realizou duas Lives nesta semana, cujo fio condutor foi o sofrimento mental. A primeira, no dia 19 de maio, foi “Sofrimento feminino em tempos de pandemia”, com a participação de Marlise Matos, professora do departamento de Ciência Política da UFMG, Diva Moreira, cientista política e professora do departamento de Psicologia da Faculdade de Ciências Médicas, e mediação de Stella Goulart, professora do departamento de Psicologia na UFMG e presidenta do APUBH. No dia 21 de maio, a segunda live abordou o tema  “Sofrimento, adoecimento e trabalho docente: em busca do cuidado”, com a participação de Juliana Antunes, psicóloga da Divisão de Acompanhamento Funcional (DAF/DRH) e integrante da Rede de Saúde Mental da UFMG, Gêisa de Carvalho, psicanalista e membro do Aleph Escola de Psicanálise, e mediação de Luiz Brant, professor da Escola de Enfermagem da UFMG.

Sofrimento feminino em tempos de pandemia

A conversa buscou abordar o sofrimento das mulheres no contexto da pandemia da Covid-19 sob diversas perspectivas. A importância do encontro foi destacada pela mediadora Stella Goulart, pois reuniu três mulheres ativistas e especialistas nas áreas da saúde mental, feminismo e igualdade racial.

Na live, a professora Marlise Matos apontou as várias dificuldades enfrentadas pelas mulheres na crise sanitária ocasionada pelo novo coronavírus, devido à presença fundamentalmente feminina na linha de frente de combate à pandemia, além da sobrecarga no trabalho de casa e aumento da violência doméstica.“Existe a urgência do cuidado, que é essencialmente um valor feminino. Não por uma dimensão essencialista e sim pelo processo histórico e social de construção da mulher. E quem cuida das cuidadoras?”, questionouMarlise. Segundo ela, é necessário enfatizar a participação das mulheres na área da saúde, que, segundo o Censo de 2010, são 90% dos profissionais. Além disso, a falta de um alinhamento nas políticas públicas contra a Covid-19 e a ausência das mulheres nos terrenos de tomada de decisão médica podem agravarsua situação psicológica. “Na enfermagem, 95% são mulheres, mas na medicina são apenas 36%. A voz das mulheres não é escutada, mesmo estando lidando diretamente com o risco”.

Marlise ainda pontua que a situação atual pede pelo conceito de “dororidade”, criado pela intelectual negra Vilma Piedade, que diz da dor e do sofrimento que aproxima as experiências das mulheres: “Existe uma dor comum que as mulheres carregam, que vem do contexto da construção das mulheres, de violências, desigualdades e relações raciais”.

A situação das populações negras na pandemia, em especial das mulheres negras, foi ressaltada pela professora Diva Moreira. “Não dá para falar de mulheres negras sem falar de um profundo sofrimento mental, que vem desde o tráfico do Atlântico”, disse.  Segundo Diva, a pandemia do coronavírus só veio para exacerbar problemas e vulnerabilidades enfrentadas pela população negra há tempos, como a falta de acesso a direitos fundamentais e o desamparo estrutural do Estado. A professora deu o exemplo de empregadas domésticas sendo classificadas como serviço essencial por governantes, e da opressão policial contra a população negra. “Quando uma mãe perde o filho para a violência policial, quem a ampara?”, questionou Diva.Ela ainda conclamou pela formação de redes de solidariedade, especialmente com as populações vulnerabilizadas, que durem para além da crise e o desenvolvimento de um pensamento utópico nesse momento, para o planejamento de novos modos de vida e sociabilidade na pós-pandemia.

 

Sofrimento, adoecimento e trabalho docente: em busca do cuidado

O debate problematizou a questão da saúde mental dentro do ambiente acadêmico. O foco foi nos docentes do ensino superior, que enfrentam a invisibilidade do problema.

O professor Luiz Brant, que mediou a conversa, apontou a importância do assunto, em especial no contexto da pandemia da Covid-19, que vem impondo novas formas de trabalho docente à distância. Brant frisou a diferença entre sofrimento e adoecimento, e também os prejuízos da inviabilização desse fenômeno na academia. “O sofrimento é o alerta, sinal de ameaça para o sujeito, e pode ser transformador se for trabalhado de forma positiva, tanto para o indivíduo como para o ambiente onde ele existe”, pontuou.

A psicanalistaGêisa de Carvalho reiterou as diferenças entre sofrer e adoecer, e também pontou as novas formas de sofrimento que a pandemia e o isolamento social vêm trazendo ao modificar diversas experiências de vida. Ela ainda problematizou a produtividade e atualização constante esperadas dos pesquisadores: “Eu sou aquilo o que eu produzo, buscando imediatamente aquilo que seria o resultado, a conquista de um processo no decorrer da caminhada acadêmica”, explicou Gêisa.

Psicóloga da UFMG, Juliana Antunes contou que sua percepção sobre o assunto veio do trabalho na instituição, que culminou em uma dissertação de mestrado. Ela relatou um distanciamento dos docentes, que não procuravam os serviços de acompanhamento psicológico da instituição. Em sua pesquisa, foi constatado que a maior vulnerabilidade está em docentes no estágio probatório devido a problemas de gestão, as relações com seus colegas e uma determinação em mostrar-se como útil para a instituição. “Precisamos questionar: que contexto acadêmico faz com que as relações sejam tão deterioradas, quais pressões estão sendo exercidas contra esses indivíduos?”, indagou Juliana.