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8M: em live, professoras da UFMG conversaram sobre as lutas das mulheres

A atividade online, promovida pelo APUBH UFMG+ em parceria com o NEPEM-UFMG, integra a programação do V Seminário Internacional Política e Feminismo. Assista na íntegra no canal do sindicato no Youtube.

Live 8M – Lutas das Mulheres no Contexto de Regressão Conservadora, no dia 22/03, com as convidadas: Rosy Mary Isaias (ICB/UFMG), Shirley Miranda (FAE/UFMG) e Marlise Matos(DCP/UFMG).

Por iniciativa da Diretoria Setorial Territórios em Movimento: Cultura, Qualidade de Vida e Direitos Humanos do APUBH UFMG+ em parceria com o Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher (NEPEM) da UFMG, o sindicato realizou a live 8M – Lutas das Mulheres no Contexto de Regressão Conservadora. A atividade online foi ao ar no Dia Internacional de Luta das Mulheres (08/03), através do canal do APUBH UFMG+ no Youtube. Assista à live na íntegra: https://youtu.be/-8V–XBbmoY

A professora Marlise Matos (DCP/UFMG), coordenadora do NEPEM-UFMG e integrante da Diretoria Setorial, realizou a mediação da live e foi uma de suas debatedoras. A discussão do tema também contou com a presença das professoras Rosy Mary Isaias (ICB/UFMG) e Shirley Miranda (FAE/UFMG). O debate integra a programação do V Seminário Internacional Política e Feminismo, cujas atividades continuam até o dia 22 de março.

Preconceitos étnico-raciais e de gênero na universidade

O debate foi iniciado por Rosy Mary Isaias, professora titular do Departamento de Botânica do ICB/UFMG. Em sua fala, ela abordou a sua vivência na universidade como mulher, negra, bióloga, professora e pesquisadora. “Eu considero que a minha presença aqui e a minha trajetória servem como exemplo e também como motivação, para que essas jovens pesquisadoras, que estão se formando na UFMG e em diferentes universidades, tenham um exemplo e saibam que, se eu cheguei até aqui, elas também podem”, definiu a cientista.

A docente relembrou que, quando começou a lecionar na UFMG, ela era a única pessoa negra em sala de aula. Ela também relembrou casos de discriminação que sofreu ao longo dos anos, na instituição. Ela sintetizou que “a medida em que nós vamos avançando em nossa trajetória, enquanto mulher, negra e cientista, vamos nos tornando fenótipos mais raros e causando estranheza”.  “O que eu tiro dessa experiência toda? É que o racismo na nossa universidade, infelizmente, é estrutural. Ele está presente no imaginário das pessoas. Ou seja, uma pessoa com esse fenótipo não é uma professora, por pressuposto”, analisou.

A professora Rosy Mary ainda trouxe à tona o caso de uma estudante que sofreu assédio sexual do seu professor orientador. O crime foi relatado por uma das ex-alunas da professora, que pediu para não ser identificada. A pesquisadora refletiu que a academia “não é um ambiente tão cordial, como nós, às vezes, fazemos parecer”. Diante dos casos de discriminação e das tentativas de deslegitimar a presença de mulheres, pessoas negras e outros grupos, ela reiterou a importância da resistência e de espaços de discussão, como o dessa live. “O momento não é favorável, mas nós não vamos desistir. Nós somos muitas, nós podemos, nós somos mais”, ratificou.

A luta das mulheres indígenas pelo direito de existir

O debate prosseguiu com a participação da professora Shirley Miranda, diretora de Políticas de Assistência Estudantil da PRAE/UFMG. Em sua fala, ela abordou a aprendizagem que vem sendo desenvolvida por mulheres indígenas na universidade pública. De acordo com a docente, há cerca de 15 anos, a presença indígena no ambiente acadêmico tem se intensificado, por causa da política de construção da educação escolar indígena, que resultou em um programa de formação intercultural em nível superior nas universidades públicas. “Essa inserção inusitada das indígenas nas universidades tem desestabilizado processos institucionais e, sobretudo, tem evidenciado um deslocamento epistêmico da pesquisa sobre os povos indígenas para a pesquisa com as estudantes indígenas”, explicou.

A docente ressaltou que “as lutas em que as mulheres indígenas se empenham são, acima de tudo, a luta pela sobrevivência”. Entre os principais pontos dessa luta está, ainda de acordo com ela, a questão da terra, o que as aproxima do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e dos movimentos de ocupação nos ambientes urbanos. Os riscos que correm no próprio corpo também é parte da luta dessas mulheres, como comentou a docente. Ela destacou ainda a forma de produção compartilhada, presente no cultivo indígena no campo, e as dificuldades no acesso à água, que vem sendo restringido pelos latifundiários.

A professora Shirley destacou que, em seu contato pessoal com as mulheres indígenas, teve um grande aprendizado do que significa o “direito de existir”. A docente destacou que essas mulheres possuem “um olhar apurado contra o consumo homogêneo e contra a destituição do ser”. Ela observou que a interação da comunidade acadêmica contribuiu ainda para o reposicionamento das mulheres entre aqueles povos, como no caso de uma estudante indígena que optou por só ter filhos após concluir a sua graduação. “Essa autonomia sobre o nosso próprio corpo, sobre o nosso ser e sobre a nossa capacidade de existir nos pertence e é nessas trocas que ela se fortalece”, definiu. “Eu aprendo com elas que devemos temperar a luta com Esperança no futuro. É só com esses temperos que a luta pode prosseguir”, finalizou.

Produção do conhecimento militante feminista

Em sua fala, a professora Marlise Matos, coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher (NEPEM-UFMG), ressaltou o papel da produção de um conhecimento que seja, de fato, militante e feminista. Esta produção de conhecimento, segundo ela, se tornou ainda mais necessária frente aos desafios impostos pela pandemia de Covid-19 e pelos ataques à Democracia em curso no país. Fazendo conexão com as contribuições das duas primeiras convidadas a falar, ela destacou esse papel frente ao momento crítico que estamos vivenciando, em que o posicionamento do patriarcado racista tem se tornando mais selvagem.

“São as mulheres que estão se perguntando o tempo todo: quais as vidas dignas de serem vividas? São elas que põem o dedo nessa ferida. São as mulheres mães negras que denunciam o genocídio da juventude negra, são as mulheres indígenas que denunciam o estupro da Mãe Terra. Esse é o discurso das mulheres quando estão diante de crises absurdas, que tem impactos seletivos e diferenciados para as vidas de homens e para a vida de mulheres”, explicou. A professora Marlise ponderou ainda que estamos passando por um momento de ruptura democrática no Brasil, em que “nós temos um déficit gravíssimo de representação e uma crise política sem precedentes, onde os poderes constituídos não estão atentos nem mesmo às regras básicas da Constituição Federal de 1988”.

A coordenadora do NEPEM ressaltou que, em meio à pandemia, “as mulheres estão sobrecarregadas, para dizer o mínimo. Há uma precariedade da vida das mulheres, que já era algo muito grave, e que agora se acentua de maneira ainda mais explícita”. No caso das mulheres na comunidade acadêmica, a professora apontou que a crise atual acarretou na queda da produtividade acadêmica de mulheres, sobretudo das que são mães, devido ao acúmulo de funções na pandemia. A partir dessa análise de conjuntura, a professora finalizou sua participação, ressaltando que “nós precisamos hoje, ainda mais do que precisávamos antes da pandemia, de um conhecimento engajado, militante, feminista, antirracista. Precisamos com urgência de reafirmar a possibilidade de produzir uma ciência responsável e responsiva, uma ciência a serviço da transformação do mundo”.