Da saúde mental à produção científica: como a pandemia afeta mulheres na Universidade?
Impactos da atual crise sanitária e humanitária para a presença feminina no meio acadêmico foram debatidos na live de abertura do Seminário FALA de MULHER no APUBH. Assista no canal do sindicato no YouTube.
Começou, na manhã desta segunda-feira (29/03), o Seminário FALA de MULHER no APUBH. O evento foi aberto com a live “Pesquisadoras na Ciência: Impactos da pandemia na saúde mental e nas atividades científicas das mulheres”. O Seminário ainda contará comdebates online nos dias30 de março e 07 de abril. Clique aqui para conferir a programação completa. As atividades são transmitidas ao vivo, através do canal do APUBH no Youtube, e permanecem disponíveis para serem assistidos posteriormente.
Na abertura do Seminário, a professora Analise da Silva, 1ª vice-presidente do APUBH UFMG+, destacou a importância de espaços de fala como este, em que podemos debater, “enquanto mulheres, professoras, estudantes, técnico-administrativas, mulheres aposentadas e na ativa, mulheres da Universidade Federal de Minas Gerais, como é que nós podemos nos juntar, cada vez mais, para a defesa e conquista das nossas pautas”. A docente pontuou que espaços de discussões coletivas, livres e democráticas fazem parte do que constitui o próprio sindicato. “Eu costumo destacar sempre, nas nossas lives e nas nossas atividades, que o APUBH somos nós: nós diretoria, nós filiados e filiadas, nós pessoas que acreditamos nas possibilidades que a Ciência pode nos trazer e nas possibilidades que a defesa dos nossos direitos pode nos trazer”, definiu a 1ª vice-presidenta do sindicato.
A professora Analise passou a palavra para Grace Schenatto Pereira Moraes, professora do ICB/UFMG e integrante da Diretoria ‘Ciência, Tecnologia e Educação’ do APUBH, que realizou a mediação do debate. Sobre a realização do evento e da escolha de terem apenas mulheres como debatedoras, a mediadora reforçou que “a fala é de mulher, mas a escuta é de todos e todas. A mulher fala e todo mundo é bem-vindo a ouvir”. Sobre a sua participação no sindicato, a professora afirmou que “tem sido uma experiência muito enriquecedora pra mim, enquanto docente e mulher, ter esse contato sobre visões diferentes sobre o mesmo problema”. “No geral, a gente entra na universidade como docente e fica muito fechado no seu departamento, na sua unidade. E, por vezes, a gente perde o sentido da universalidade que precede a Universidade, e o sindicato é um espaço em que nós temos esse tipo de oportunidade de interagir com as realidades dentro da universidade”, definiu a integrante da Diretoria Setorial do APUBH UFMG+.
Impactos da pandemia para as mulheres cientistas
A primeira convidada a ter a palavra foi Pâmela Billig Mello Carpes, professora associada da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA), integrante da Comissão Mulheres na Fisiologia da Sociedade Brasileira de Fisiologia (SBFis) e atuante na causa das mulheres na Ciência e participante da equipe da Parent in Science. Em sua fala, a professora abordou o impacto da pandemia nas atividades científicas das mulheres. Ela explicou que as dificuldades de inserção e permanência feminina nas áreas de CT&I são anteriores à crise atual. “A pandemia começou a exacerbar uma diferença de gênero, que já sabíamos que existia dentro da Ciência”, observou a docente da UNIPAMPA.
Apresentando dados de pesquisas nacionais e internacionais, a cientista demonstrou como a responsabilidade de cuidados, sejam domésticos ou com pessoas, recai mais sobre mulheres. De acordo com a professora, essa responsabilidade, especialmente no caso da maternidade, afeta negativamente a produção e a carreira de mulheres cientistas. Além disso, este é um dos fatores que contribuem para afastar as mulheres das carreiras científicas.
Pâmela Carpes destacou que, em curto prazo, a realidade imposta pela quarentena da Covid-19 faz com que as mulheres cientistas tenham um número menor de submissões de trabalhos acadêmicos, percam prazos e tenham menor participação em eventos. E em longo prazo, ela acredita que, com menos publicações, essas pesquisadoras podem sofrer com menos competitividade e financiamento. Para lidar com essa realidade, a professora afirmou que “é fundamental considerar políticas e ações afirmativas, que levem em consideração esse impacto, que vemos de gênero e de raça, para tentar mitigar esses efeitos e equalizar a competitividade de diferentes cientistas”.
Impactos da pandemia na saúde mental
Prosseguindo com o debate, a palavra foi passada para a convidada Patrícia Henrique Peles, professora e coordenadora do curso de Psicologia do Centro Universo BH, doutoranda em neurociências na UFMG e integrante do Ambulatório de Neurologia Cognitiva e Comportamental da UFMG. Na avaliação da psicóloga, as particularidades físicas e psíquicas das mulheres geram relações desiguais no ambiente acadêmico, especialmente ao lidar com homens na mesma função. Ela citou as mudanças hormonais e comportamentais a que o corpo feminino passa no período menstrual, bem como a pressão sociocultural a que as mulheres estão expostas, por exemplo, o julgamento sobre a decisão ou não pela maternidade. E aprofundando no papel que as mães exercem, Patrícia Peles comentou que esta função pode prejudicar outras áreas da vida da mulher, devido às demandas que são socialmente atribuídas às mulheres, como a educação dos filhos.
A doutoranda em neurociências avalia que, no caso da pandemia, em que o Home Office se tornou norma para a maior parte das funções exercidas no meio acadêmico, o trabalho vem afetando a saúde mental feminina. De acordo com ela, em grande parte, isso se deve à quebra da diferenciação entre os ambientes laboral e do lar. “Hoje, nesta questão contemporânea, nós temos mais casos de ansiedade entre mulheres do que nós já tivemos em todo o tempo, por conta dessa dificuldade que é se dividir, cada vez mais, entre esses dois papéis: o papel profissional e o papel pessoal, de ser mãe, de cuidar do lar, de ser nutridora”, pontuou a professora.
A pesquisadora apontou a importância de medidas que dêem respaldo e sustentação às mulheres, para que estas possam lidar com questões físicas e repensar conflitos mentais, que são próprias da condição feminina e da sua integração na sociedade. Ela ressaltou, no entanto, que cada mulher responde de maneira particular e única às condições a que se encontra exposta. “Essa possibilidade de dar à mulher a condição de ser respeitada por aquilo que ela é, de se colocar dentro de um processo natural, de se ver de uma forma natural dentro do mercado de trabalho, é também respeitar as suas individualidades”, afirmou a psicóloga Patrícia Henrique.