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Universidades reagem ao MEC: ‘Não é possível, por meio de um ofício, dizer que reitores devem descumprir a lei’

Fonte: PROIFES-Federação.

Foto: Guilherme Santos/Sul21

Dirigentes de universidades e institutos federais de todo o país alertam que um clima de caos pode recair sobre as instituições de ensino caso seja implementado o que determina um ofício encaminhado pelo Ministério da Educação no início deste mês. Por meio desse ofício, o MEC determinou que universidades e institutos federais de todo país não paguem mais aos professores horas extras, adicional noturno, insalubridade, aumento salarial por progressão de carreira ou qualquer outro ato que provoque o aumento de despesas.

“Fomos pegos de surpresa e ainda estamos analisando o real impacto desse ofício. temos uma reunião de gestão da universidade amanhã à tarde e depois teremos uma reunião também com a nossa procuradoria jurídica com o objetivo de analisar com a devida profundidade o teor desse ofício”, disse Pedro Hallal, reitor da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). O reitor adiantou algumas observações sobre o conteúdo da manifestação da União. “Quando fala em horas extras, é importante assinalar que a UFPEL já não paga hora extra pra coisa alguma faz muito tempo. Neste aspecto não nos afeta em nada”, exemplificou.

Por outro lado, assinalou ainda o reitor da UFPEL, há outras questões que são mencionadas no ofício que dizem respeito ao cumprimento de leis já estabelecidas. “Quando o ofício diz que não podemos incluir novos adicionais de insalubridade, existe uma lei que rege isso. Ninguém paga insalubridade para quem não tem direito à insalubridade. Se contratarmos um médico para o hospital e ele for trabalhar na área que tem pacientes com tuberculose, por lei ele tem que receber insalubridade. Então, esse ofício é até meio inócuo para falar a verdade. Vai demorar cinco minutos para a pessoa entrar com um mandado de segurança na Justiça e a decisão judicial vai nos obrigar a pagar. Não é possível, por meio de um ofício, dizer que os reitores devem descumprir a lei”, afirmou Hallal.

Há outros temas mencionados no ofício, acrescentou, que dizem respeito a promoções e progressões, que também são regidos por leis. “O que esse ofício gera, em alguns casos, é o conflito de leis. O reitor vai ter que escolher qual lei vai cumprir, ou cumpre a Lei de Responsabilidade Fiscal, citada no ofício, ou cumpre a Lei da Carreira, por exemplo. Se o servidor cumpre todos os requisitos para progredir eu não tenho como impedi-lo de progredir. É um ofício confuso que não foi dialogado conosco antes do seu envio. O que posso garantir é que o conteúdo desse ofício é avassalador . Se for exigida das universidades a interpretação literal desse ofício, elas entrarão num caos total porque teríamos que escolher qual irregularidade cometer, não a partir daqui um mês mas a partir de amanhã. Todos os dias terei que escolher qual irregularidade vou cometer”, alertou Pedro Hallal.

Em nota oficial, a reitoria da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) também assinalou que as contratações e demais atos inerentes à progressão funcional decorrem de previsão legal e que, somente mudanças na legislação vigente, poderão importar em perda ou suspensão desses direitos. O pagamento da folha de pessoal é responsabilidade do Ministério da Economia e seu descumprimento importará, dentre outros, violação à Lei da Responsabilidade Fiscal”, destacou. Diante disso, a UFSM informou que seguirá com as nomeações previstas, dando sequência ao calendário letivo e às atividades planejadas para este ano, bem como também manterá os benefícios e concessões aos servidores, conforme previsão legal.

A Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) disse, em nota, que “as rotinas relativas à administração de pessoal prosseguem normalmente e que, conforme as orientações discutidas no Conselho Pleno da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), ocorrido em 12 de fevereiro, está realizando levantamentos internos e consultando a Procuradoria para compor um quadro dos possíveis impactos administrativos e legais do teor dos ofícios na Universidade”. A UFRGS afirmou ainda que “está empenhada em garantir os direitos, legalmente assegurados, dos servidores e que busca esclarecimento técnico junto ao Governo Federal. Além disso, aguarda resultados da análise da assessoria jurídica da Andifes e dos contatos da associação com o Tribunal de Contas da União, entre outras ações”.

Já a Reitoria da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) informou que está avaliando as implicações orçamentárias e jurídicas do referido ofício junto à Procuradoria Federal. Além disso, está acompanhando os resultados dos encaminhamentos feitos pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES) ao Tribunal de Contas da União (TCU), assim como também junto aos parlamentares. “Entendemos que é preciso agir de forma cautelosa, uma vez que o tema ainda está sendo debatido, pois trata do não pagamento de direitos adquiridos pelos servidores. Por isso, até o momento, não fizemos nenhum encaminhamento”, afirmou a instituição.

Algumas instituições, porém, já tomaram medidas para o cumprimento da decisão. O Instituto Federal de São Paulo, por exemplo, decidiu suspender por tempo indeterminado o pagamento de adicional noturno, promoções e horas extras em função do ofício expedido pelo MEC. O IFRS decidiu não se manifestar oficialmente ainda por avaliar que as informações sobre o teor do ofício ainda não estão claras o suficiente. O tema será tratado esta semana na reunião do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif) em Brasília, da qual o reitor do IFRS, Júlio Xandro Heck, participará.

“Medida perversa para toda sociedade”

Presidente da ADUFRGS-Sindical, Lúcio Vieira classificou o ofício do Ministério da Educação como uma “medida perversa não só para as universidades e institutos federais, mas para toda a sociedade”. “Estamos acompanhando de perto esse assunto. Estou em Brasília agora para participar da posso de novo presidente do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif) e vamos conversar com ele sobre esse tema”, anunciou.

Lucio Vieira destacou dois aspectos no ofício encaminhado pelo MEC às universidades. Em primeiro lugar, assinalou, a medida segue a lógica da emenda do teto dos gastos (Emenda Constitucional 95), que propõe a diminuição do tamanho do Estado e, na área da educação a redução do papel das universidades públicas. “O governo Bolsonaro quer sucatear algo que deveria ser um dos principais patrimônios da sociedade brasileira. Não é por acaso que Paulo Guedes foi indicado para o Ministério da Economia e que, para o Ministério da Educação, foi indicado alguém que não é desta área e que não tem nenhuma condição de gerir essa Pasta. Estamos vivendo um momento doloroso com políticas perversas para toda a sociedade”.

Em segundo lugar, o presidente da ADUFRGS-Sindical chamou a atenção para o caráter ilegal da medida que pretende levar os reitores a descumprirem a lei. “Como é que os reitores vão agir frente a uma determinação ilegal, para que não cumpram a lei. Vamos conversar com reitores defendendo que mantenham uma posição de unidade em defesa da observância da lei que regula a carreira de professores e servidores. Os reitores têm que cumprir a lei, fazendo o que ela determina que deve ser feito. Eles não podem abrir mão disso, como agentes públicos eleitos para atuarem como dirigentes das instituições. Lucio Vieira anunciou que o sindicato conversará também com parlamentares e com o Ministério Público Federal para discutir ações que garantam os recursos públicos necessários para o funcionamento das universidades e institutos federais.

Fonte: Luis Eduardo Gomes e Marco Weissheimer/Sul 21