Novos cortes na Educação podem levar universidades públicas a fecharem as portas
Fomos surpreendidos com mais um contingenciamento absurdo no orçamento da Educação no país. Dessa vez, o governo Bolsonaro bloqueou mais de R$ 1 bilhão na verba que já está escassa. O bloqueio foi anunciado na sexta-feira passada, dia 30 de setembro, às vésperas do primeiro turno das eleições. Isto é, na calada da noite, enquanto o país estava mobilizado para o pleito que definiria os próximos 4 anos do país. O anúncio foi oficializado no Decreto 11.216, que altera o Decreto nº 10.961 de 11/02/2022. Por enquanto, ainda se trata de um contingenciamento. Ou seja, os valores estão retidos, porém ainda não foram cortados em definitivo. Contudo, em se tratando do atual governo, o corte já pode ser dado como certo. Afinal, a sua grande preocupação é com o pleito eleitoral do segundo turno, além do orçamento secreto e não o atendimento às necessidades básicas do povo brasileiro.
Esse, no entanto, não é o primeiro bloqueio esse ano. Entre julho e agosto, já foram contingenciados cerca de R$ 1,34 bilhão da Educação. Se somarmos todos os bloqueios, a perda chega a R$ 2,4 bilhões. A situação é gravíssima e, após mais esse golpe, as universidades públicas estão realmente perto de terem de fechar as portas. Chegamos a uma situação em que vai faltar dinheiro para pagar os funcionários e até para o custeio dos custos mais básicos para manter o funcionamento destas instituições. Na prática, isso significa também menos dinheiro para pagar contas de água e de luz, para a limpeza, para os restaurantes universitários. Além do que, as bolsas para permanência de estudantes também serão afetadas, levando à evasão escolar daqueles que não terão condições de se sustentar e a seus estudos sem esse auxílio.
Em repúdio à nova medida do governo, a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) publicou uma nota chamando a atenção para a situação que está sendo imposta às universidades públicas. Nela, a entidade denuncia a redução contínua que as Universidades Públicas têm sofrido nos últimos seis anos e destaca que “desta vez as limitações foram distribuídas em todas as unidades do MEC (incluindo universidades federais, institutos federais, CAPES), que sofreram o mesmo corte linear de 5,8%”.
A Andifes apontou ainda que o novo corte representa R$ 328,5 milhões a menos no orçamento das universidades. E que quando somados com os contingenciamentos anteriores resultam em R$ 763 milhões a menos no orçamento que já havia sido aprovado para este ano. Isso equivale a um percentual por volta de 13,6% da verba anual destinadas e aprovadas as instituições e que subitamente, são subtraídas. É uma redução tão drástica e absurda que condena a educação pública à indigência e praticamente inviabiliza a gestão das instituições, a exemplo das Universidades Públicas. É, na prática, obrigar reitores e reitoras a optar pelo fechamento das portas por não ter mais aonde cortar gastos para garantir a sobrevida das universidades.
E como não poderia ser diferente, o próprio Ministério da Educação já falou em mais cortes para o ano de 2023. O MEC enviou comunicado para os reitores avisando que está prevista a redução de cerca de R$ 300 milhões para os institutos federais, em comparação com o orçamento deste ano. Para se ter ideia do tamanho do estrago, nos últimos dez anos, o orçamento para 2023 só não será menor do que o 2021.
Dados divulgados pelo Centro de Estudos Sou Ciência sobre as perdas de recurso até o início de setembro mostram que o governo Bolsonaro reduziu em 94% o orçamento que deveria ser destinado às universidades federais, nos últimos quatros anos. E também houve redução no orçamento de 19 dos 21 institutos de pesquisa existentes no país, entre 2019 e 2021. Em outras palavras, o governo Bolsonaro está conseguindo matar as Universidades Públicas e a Ciência do Brasil, linha de frente do projeto ultraneoliberal.
Não podemos deixar de mencionar que, apesar da política de Estado de subfinanciamento que o governo Bolsonaro tem aplicado sobre as Ciências, os professores universitários e pesquisadores continuam desempenhando um papel fundamental para a formação cidadã e a população. A pandemia foi e continua sendo um exemplo prático e dramático disso.
A realidade vivenciada é tão séria que, os cortes não vêm sozinhos. Estamos lidando com um governo que também não se priva em espalhar mentiras e desqualificar a todos nós, que somos professores universitários, pesquisadores e servidores públicos federais. A vítima mais recente é a professora Deisy Ventura, cientista da USP que foi indicada para compor o Comitê da Organização Mundial da Saúde sobre a revisão do regulamento sanitário internacional. Ela, porém, não pode aceitar a indicação, pois foi boicotada pelo governo Bolsonaro, quando o seu nome foi submetido à aprovação do Ministério da Saúde.
E pensar que a submissão do nome da professora ao Ministério deveria ser uma mera formalidade. Afinal, a cientista não agiria como representante do país e, muito menos, do governo federal. Além do mais, a professora Deisy já havia passado pela devida avaliação da OMS. Há suspeitas de que o boicote seria retaliação por ter se manifestado contra o negacionismo do governo Bolsonaro na condução da pandemia. Enfim, é uma cientista sendo punida pela sua ética, por ter se pautado na Ciência e por ter defendido a vida da nossa gente.
Outro fato digno de nota para a ciência brasileira é a autorização dada pela ANVISA para que a SpiN-Tec, a vacina contra a Covid-19 que está em desenvolvimento no CT Vacinas da UFMG, passe para a etapa de testes clínicos de fase 1 e 2. Ou seja, o imunizante começará a ser testado em pessoas. Essa é a nossa “balbúrdia” – a pesquisa e a ciência salvando vidas!
Agora, imaginem o nível de avanço científico que poderíamos alcançar no país, se o setor recebesse a atenção e os recursos preconizados pela Constituição Federal de 1988. principalmente, a Universidade Pública, que é a principal produtora de Ciência no Brasil. Nós precisamos, aliás, temos a obrigação de nos mobilizarmos para defender um dos maiores direitos do povo brasileiro: o direito à educação, à universidade pública, gratuita, inclusiva e de qualidade social e científica. Não podemos nos omitir. É a educação que transforma um povo e um país. Deixar fechar as portas das universidades, institutos de ensino e de pesquisa é condenar o país ao ostracismo internacional, à fome, à miséria, ao analfabetismo, à corrupção e ao aceitarmos o fim de um projeto mais justo, mais igualitário e democrático de nação.