Saúde dos(as) trabalhadores(as) em foco: atualização da Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho
O trabalho é perpassado por um importante paradoxo: de um lado é potencial fonte de promoção e produção de saúde física e mental, do outro possível gerador de adoecimentos. Apesar desse reconhecimento, o estabelecimento do nexo causal entre o sofrimento ou doença manifestados é desafiador, especialmente no campo da saúde mental. As vertentes individualistas e psicologizantes muitas vezes atribuem como causa dos sofrimentos questões de cunho individual, sem considerar a produção social do que é apresentado como sofrimento, especialmente as relações estabelecidas no e pelo trabalho.
Nesse ponto, a Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (LDRT) é um importante instrumento clínico e epidemiológico, já que o material agrega experiência técnica e científica sobre os agravos à saúde e suas relações com as condições sociais e laborais em que estamos inseridos. O reconhecimento dos possíveis nexos causais e a sistematização dos mesmos é de suma importância para pensar em saúde do trabalhador como problema social e de saúde pública, bem como subsidiar parâmetros para estabelecimento de políticas públicas que ataquem com efetividade a fonte real dos problemas gerados.
Em novembro de 2023 houve a atualização da LDRT, o que representa um importante avanço nas pautas relativas à saúde dos(as) trabalhadores. A versão publicada em 2001 contava com a descrição de 182 patologias e após cerca de 20 anos, a atualização passou a descrever 347 doenças, ou seja, houve uma adição de 165 patologias. A lista foi atualizada em 2020[1], com publicação no Diário Oficial da União a Portaria nº 2.309/GM/MS, no entanto, no mesmo ano a portaria de atualização foi revogada. Em um governo, à época, marcado pelo obscurantismo e muitos retrocessos para a classe trabalhadora, esse foi mais um ato de censura e anacronismo. É importante lembrar que até mesmo a COVID-19 havia sido inclusa na lista como possivelmente provocada pelo trabalho, já que, àquela época, com a restrição de circulação, muitas pessoas saíam de casa com objetivo e destino único de ir para seus trabalhos presenciais e nesse percurso ou mesmo no ambiente laboral poderiam se contaminar.
As patologias e morbimortalidades relacionadas ao exercício laboral tem altos custos sociais, como custos com previdência, custos elevados com saúde, perda geral e produtividade no âmbito individual e social, portanto, a atualização e reconhecimento técnico e científico da LDRT amplia a perspectiva de saúde de maneira geral, do Sistema Único de Saúde e os órgãos de saúde do trabalhador, dos órgãos previdenciários e, dessa maneira, auxilia na efetividade do reconhecimento e responsabilização dos fatores de adoecimentos.
Os acréscimos na LDRT trazem mais praticidade, segurança e amparo técnico científico para a aferição do nexo causal entre os adoecimentos e o trabalho, além de combater a defasagem de anos de adoecimentos causados no trabalho sem o devido reconhecimento. Além disso, amplia a possiblidade de afastamentos por doenças relacionadas ao trabalho e não mais por doença comum. Isso repercute diretamente nos direitos da classe trabalhadora, que passam a ter o reconhecimento dos seus sofrimentos e os seus reais motivadores e, a longo prazo, na responsabilização das condições de trabalho potencialmente adoecedoras.
Dentre as adições presentes na LDRT, alguns transtornos mentais foram inclusos como Burnout e também alguns tipos de cânceres. Lembrando que, o fato da doença não estar descrita na lista não impede que ela tenha sido gerada pelo trabalho. É necessária investigação técnica do nexo causal. É nessa medida que a compreensão das relações entre nossa subjetividade, nossa saúde e o sistema de trabalho ao qual estamos submetidos avança. A luta por condições dignas de trabalho, que favoreçam a saúde dos trabalhadores e trabalhadores é primordial!
https://www.scielo.br/j/rbso/a/rbPkmWjQLBqJpqTYcGPrjYH/
https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2023/novembro/ministerio-da-saude-atualiza-lista-de-doencas-relacionadas-ao-trabalho-apos-24-anos
[1] https://www.scielo.br/j/rbso/a/rbPkmWjQLBqJpqTYcGPrjYH/