Em discurso de posse da nova gestão do sindicato, presidenta defendeu a universidade pública
Gestão “TRAVESSIAS NA LUTA: Mobilizar, conectar, fortalecer, sonhar tomou posse no último dia 15 de outubro.
Confira abaixo o discurso da presidenta do APUBH UFMG+, Maria Rosaria Barbato.
Bom dia a todes,
sejam bem-vindes, neste dia que representa o marco da posse da próxima gestão do sindicato dos Professores de Universidades Federais de Belo Horizonte, Montes Claros e Ouro Branco – (Gestão 2022 -2024).
Em nome da chapa eleita, Travessias na Luta: Mobilizar, Conectar, Fortalecer, Sonhar agradeço o apoio recebido e a confiança em nós depositada pelos professores e pelas professoras filiado(a)s da UFMG.
Como professora estrangeira, que abraçou o Brasil, terra que amo, ao ponto de me tornar uma “ítalo-mineira”, e que por ele resolveu lutar junto com o povo, pessoalmente agradeço profundamente e humildemente o(a)s colegas que, para além das aparências e das formas, e mostrando maturidade política e horizontes largos, quiseram dar voz a substancia e aos conteúdos, na compreensão da sinceridade do meu desejo e dos companheiros(as) de colocar à disposição da categoria, o propósito da luta, para dar voz aos anseios coletivos da nossa categoria por justiça social, por democracia, por melhores condições de trabalho e pesquisa, pela educação pública, me legitimando na liderança do Sindicato APUBHUFMG+, órgão máximo de representação da nossa categoria. Nas últimas eleições do sindicato, os professores e professoras reconfirmaram a nossa gestão anterior, nela confiando, gestão da qual nos propomos a dar continuidade.
Também agradecemos aos que nos negaram seu voto, como é normal que seja no processo democrático, onde a riqueza está na troca construtiva das ideias e não no estéril confronto que não aponta para lugar nenhum.
O meu agradecimento a todo(a)s diretores(as) que compõem a atual diretoria do sindicato e conselheiro(a)s (do Conselho Fiscal e do Conselho de Representantes) que aceitaram se reconduzir a aos novos que se candidataram na expectativa de poder contribuir para as jornadas que nos esperam.
Também agradeço em nome da diretoria eleita aos diretores(as) e conselheiros(as) que estão de saída, pois entendemos que cada um tem seus tempos, seus momentos e necessidade de se doar, e às vezes, e legitimamente, de forma diferente, convidando-os a nunca se afastarem de nós, pois o que nos ficou claro nesta caminhada foi que a nossa força é a nossa união, e a síntese da dialética das ideias que nos permite, no dialogo permanente, ler e compreender as entrelinhas da perversão do inimigo número um da educação pública gratuita e de qualidade social e científica: o Capitalismo e seu nefando desdobramento, o neoliberalismo, orientado pela exacerbada racionalidade individualista, pela falta de empatia, pela busca desenfreada pela maximização de lucros (e do qual o Governo Bolsonaro representa, a nosso ver, mais um aberrante e desumano desdobramento). A racionalidade neoliberal está lá fora, nas salas e espaços diversos da nossa Universidade, permeando-os e contaminando-os com sua lógica perversa, que aponta para a naturalização, por parte de nossa categoria, da privatização do ensino, da pesquisa e da extensão e do estéril e vazio ensino remoto que na maioria das vezes reforça a perspectiva da educação como mercadoria, como negócio altamente lucrativo e rentável, enquanto lutamos para que a Universidade Pública continue pública e seja um espaço plural, acessível e aberto a todos, um laboratório de ideias e espaço das reflexões, lugar de corpos e vozes diversas, mistura de conteúdos e saberes.
Saúdo todos os/as colegas e uma saudação especial aos nossos(as) aposentados(as) para os quais esta gestão pretende ter um olhar mais cuidadoso e, por isso, criamos uma diretoria setorial que cuidará da aposentadoria e do seu preparo, chamada Diretoria Aposentar.
A nossa gestão que termina (2020 – 2022) nasceu “pandêmica”. Fomos eleitos durante um momento de muitos e inesperados desafios. Tateamos em muitos momentos escuro, tivemos que nos reinventar. Lidamos, ao ingressar no sindicato, com a necessidade de estabelecer processos internos e métodos novos de trabalho. Isto demorou bastante, mas acredito que hoje o sindicato tenha uma organização interna com suas rotinas e processos bastante sólidos e estruturados, sabendo que, alguns deles, ainda precisam se tornar mais fluidos.=
Conseguimos garantir transparência de nossas ações e de nossa contas, aumentar os processos democráticos, envolvendo os filiados e filiadas e o Conselho de Representantes nas tomadas de decisões mais importantes do Sindicato. O APUBH que já na gestão 2018-2020, na qual fui vice-presidenta, havia dado ótimos passos para sair do imobilismo e do isolamento, caminhou para a consolidação do seu papel de representação efetiva e organizada da sua categoria, construindo pontes com os outros setores da Universidade (TAEs e estudantes) e com outras importantes entidades da Educação e do Setor Público, nos tornando referência para outras Universidades e nos tornando conhecidos em nível local e até nacional.
Apostamos numa equipe interna de grande valia, que formamos e continuaremos formando para que os próprios funcionários tenham uma maior compreensão do espaço e da realidade em que atuamos. Equipe que agradecemos por todo apoio e suporte de sempre, todos os dias. Também agradecemos o assessoramento externo indispensável, as consultorias jurídicas de toda hora, bem como as assessorias da informática. Em época de redes sociais e lutas mediáticas, apostamos bastante na comunicação do Sindicato, fortalecendo o setor e politizando nossa comunicação, tentando dar visibilidade a nossa atuação, buscando furar a bolha dos algoritmos e do falar para nós mesmo. Em muitos casos acertamos, em outros nos mesmos ficamos decepcionados. E é assim, errando, reconhecendo os erros e refazendo caminhos que temos aprendido e aprimorado nossa atuação em todos os espaços em que operamos.
Um importante passo ainda não foi dado, que todavia é fundamental para o avanço do programa de fortalecimento do nosso sindicato, votado pela base que nos elegeu, que é a vinculação do APUBH ao sindicato nacional ANDES, pelo qual temos já comunicado a nossa posição a favor desta vinculação, para finalmente sairmos do isolamento que nos relega a ser um Sindicato local, com uma carta sindical inutilizada e inutilizável e um grão de areia ainda impossibilitado a somar e contribuir com nossa voz e nosso voto para compor o mar dos grandes debates e desafios acerca da Educação e da Universidade Pública do País.
Até aqui ousamos com responsabilidade um caminho que deu certo, quando dependeu de nós juntamente com toda a categoria. E a ousadia nesta gestão que se inicia, permanece no fundo do nosso agir, deixando espaço no nosso mote nas palavras “fortalecer e conectar”, entendendo que a maior ousadia neste momento é trabalhar para fortalecer as conexões em vários sentidos. Em primeiro lugar com e entre entidades, locais e nacionais, e em especial com o ANDES Sindicato Nacional, única entidade capaz de compor dentro de si o pluralismo de ideias que verdadeiramente buscam soluções para a defesa e a sobrevivência da Universidade pública, gratuita e de qualidade social e científica. Também teremos a ousadia de tentar reconstruir os laços quebrados pela pandemia que nos afastou do convívio, da troca proveitosa de palavras, abraços e sorrisos.
Lidamos com o drama do isolamento social, das perdas de entes queridos, do sofrimento da solidão, dos adoecimentos mentais, da sobrecarga de trabalho. Tentamos, mesmo com as dificuldades da conjuntura e do ineditismo de uma atuação sindical distante fisicamente de sua base, aprimorar o contato à distância com os docentes, e nos aproximarmos abraçando-os com formas de acolhida que se substanciaram no fortalecimento do Núcleo de Acolhimento e Diálogo – NADi. Fizemos o que estava nas nossas possibilidades e o que as nossas pernas permitiram.
Apesar de ainda vivermos uma pandemia, a situação está bem melhor do que os últimos anos. E teremos, esperamos, nos próximos anos a possibilidade de executar de melhor forma um caminho de maior aproximação com a nossa base de filiados e filiadas.
Trabalharemos também para tentar reconstruir os laços quebrados por um desgoverno que polarizou a população (perseguindo interesses particulares), dividiu as famílias e as amizades, e a própria universidade, enquanto reflexo da sociedade, confundindo, instrumentalizando a boa fé das pessoas, divulgando notícias inverídicas, fazendo apologia ao ódio que envolvia sistematicamente, a misoginia, o racismo, a xenofobia, a lgbtfobia, , o neonazismo, a apologia a crimes contra a vida e a intolerância religiosa. Teremos um olhar muito especial para a pessoa, para o ser humano e para o professor e a professora como figura fundamental para o futuro do país, prezando pela valorização não apenas da sua pessoa, mas também do seu papel na história do Brasil.
A coesão social hoje está ameaçada no mundo todo. Mas no Brasil esta ameaça toma força por ser um país extremamente desigual, onde milhões de pessoas vivem situações dramáticas, com incertezas, precariedades, desemprego, pobreza e miséria profunda, pela falta de orientação de um governo firme e ao mesmo tempo humano, que não investiu no presente e no futuro de seu povo, e roubou os sonhos de milhões.
Falaremos a linguagem do convívio, para além da atuação política e sindical, a linguagem da valorização das diferenças. Nosso futuro está suspenso entre o risco do aprofundamento do autoritarismo e das polarizações e o Brasil da esperança e da vida. Sejamos visionários.
No programa da chapa Travessias na Luta: Mobilizar, Conectar, Fortalecer, Sonhar fala em sonhos, traz a seguinte passagem:
“Shakespeare, na peça “A tempestade” (1611) nos convoca: “Somos feitos da matéria dos sonhos (…)”. Seus personagens nos falam da importância de uma vida com sentido. Isolados vamos construindo e creditando aos muros sua função intransponível. Os sonhos são matérias fundamentais para nossa sobrevida, com a remontagem que nele se inicia para que laços possam ser edificados, reconstruídos, fortalecidos. O governo Bolsonaro nos lançou no caos econômico, político, social e ambiental, com numerosas ausências e perdas, desde aquelas no âmbito do pessoal, às perdas coletivas, e que não devem ser tomadas, nenhuma delas, como definitivas e irreparáveis. O sonho não é uma mensagem separada de nossa realidade, contrariamente, representa um encontro com o que nos atravessa. O sonhar é a ação humana que cria lugares e potência, onde o encontro diante da constatação da angústia e do espanto nos leva a encontrar saídas. É tempo de integração e reparação! Sonhos são comunicação, um convite a experimentar outros começos. Assim que sonhos queremos sonhar? Um novo porvir, em que a democracia e o respeito ao outro e aos direitos da(o)s professora(e)s, da(o)s servidora(e)s públicos e da classe trabalhadora em geral estejam ao alcance de todos? Vamos juntos sonhar?”
Sonhar com uma universidade forte, com recursos o suficiente para executar a pesquisa, o ensino e a extensão de qualidade social e científica; que consiga produzir tecnologias sociais e de ponta a partir dos esforços dos pesquisadores, tendo as condições materiais para fazê-lo. Sonhar com um servidor público federal valorizado, que tenha seu salário reajustado. Sonhar que nunca mais seremos chamados de “preguiçosos”, “doutrinadores”, “intelectualoides” “capazes apenas de fazer balbúrdia” e comparados a “zebras gordas”, a “parasitas”, e que se acabe de vez com a disseminação de notícias falsas sobre nosso ofício. E o que permite que o sonho aconteça? A Luta. É a Luta que permite tornar realidade o intangível, o inimaginável.
O exemplo é a Lei de Cotas. Décadas atrás, era impossível a um negro, pobre, periférico se imaginar na universidade. A herança escravocrata e o racismo estrutural presente em nossa sociedade não foi um impedimento para a luta pelo movimento social negro.
E hoje, 10 anos após a aplicação da Lei de Cotas, a pesquisa Censo da Educação Superior, realizada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), evidenciou que houve o aumento de 842% dos alunos indígenas em cursos de ensino superior entre 2010 e 2017. Levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), elucidou que entre 2010 e 2019, o número de discentes negros e pardos no ensino superior aumentou em 400%, e que isso não gerou queda na qualidade educacional, alardeada pelos liberais e pelos ultradireitistas fascistas. Muito pelo contrário, sequencialmente, nas provas do ENADE, os discentes cotistas conseguem demonstrar o mesmo desempenho médio do que os alunos não cotistas, isto é, o desempenho desses dois grupos de alunos tende a ser o mesmo no decorrer dos anos.
Darcy Ribeiro profetizou, anos atrás que a crise da educação no Brasil não é uma crise, é projeto. E é essa a dura realidade que nos foi imposta em quatro anos de governo fascista. Cortes, descrédito, descaso.
Mas, conforme escreveu Paulo Freire, na carta chamada “Do Direito e do Dever de Mudar o Mundo”, os sonhos são projetos pelos quais se luta. Sua realização não se verifica facilmente sem obstáculos. Implica, pelo contrário, avanços, recuos, marchas às vezes demoradas. Implica Luta.
Os conglomerados educacionais privados, os governos golpistas, os governos fascistas, os burgueses, aqueles que mandam e desmandam no mundo pelo seu poderio econômico combinaram de nos matar, nós precisamos combinar de não morrer! E não morrer passa em sonhar e lutar por um mundo melhor, por uma realidade melhor, em que a igualdade não seja uma palavra esvaziada de sentido, mas sim a lógica imperante em todo mundo.
Lutaremos muito, em nossas lutas locais e nacionais, para concretizar nossos sonhos, fazer do mundo um lugar melhor, mais justo, igualitário. Lutaremos, com unhas e dentes, para que esta e as próximas gerações tenham acesso a uma Educação Pública, gratuita, de qualidade social e científica.