Durante a pandemia, docentes lidam com o desafio de conciliar trabalho, vida privada e parentalidade
O NADi APUBH conversou com a categoria sobre esta questão, na quarta edição da Roda de Conversa “Tudo certo como 2 e 2 são 5”.
No dia 13 de agosto, o Núcleo de Acolhimento e Diálogo do APUBH (NADi APUBH) realizou mais uma Roda de Conversa da série “Tudo certo como 2 e 2 são 5”. Assim como nas edições anteriores, o objetivo era coletivizar demandas e desafios vivenciados pela categoria docente em um contexto tão complexo como o da pandemia da covid 19 Desta vez, o tema proposto foi: Docência e parentalidade: Pandemia x Trabalho x Vida Privada. O evento contou com a participação da professora do departamento de História da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG, Dra. Miriam Hermeto de Sá Motta, e com o professor da Faculdade de Letras da UFMG, Dr. Ricardo Augusto de Souza. Ambos trouxeram experiências e reflexões para o debate.
A pandemia parece ter “revirado a vida do avesso” e combinar a docência, o trabalho e a parentalidade tornou-se um grande e penoso desafio. Na opinião da professora Miriam, o isolamento social imposto pelo contexto sanitário conferiu, além dos limites físicos, fronteiras de afeto. A forma de nos relacionarmos com o mundo ao nosso redor ficou diferente, as formas de afeto se transformaram. Como afirmou a professora: “Somos tantos outros em outros momentos da vida e o isolamento social nos limitou aos papeis sociais de docentes, mães e pais”. Ainda de acordo com ela, a situação se tornou ainda mais dramática e difícil para as mulheres, em uma sociedade patriarcal e machista, pois ficam sobrecarregadas com a responsabilidade de uma monoparentalidade não planejada. Como “Ser professora nessa sociedade é diferente de ser professor”, ressaltou.
Refletindo sobre o tema proposto, o professor Ricardo Souza pontuou que é preciso lidar com as demandas da docência, com os prazos e com a “espada em cima da cabeça”, quando o local de trabalho deixa de existir simbolicamente e há uma invasão profunda da vida privada. É preciso lidar com os cuidados com os filhos e filhas que agora também tiveram seus lares transformados em escolas, com as preocupações diárias do contexto doméstico e, claro, com o medo constante da contaminação e das consequências dela. Administrar a saúde mental perante tantas demandas, tornou-se mais uma das atividades cotidianas. Sem separações de espaços físicos e simbólicos os sentidos da vida, do trabalho e da vida privada se misturam. Como afirmou o professor Ricardo Souza: “Há uma presença dentro de casa que, contraditoriamente, deflagra-se em uma ausência radical”.
Com o home office, os intervalos, as pausas e, principalmente, o compartilhamento da vida cotidiana desapareceram. O isolamento impõe uma quebra dos vínculos solidários que formam coletivos de trabalho. No cenário virtual, nas reuniões não há espaço para debates “não produtivos”, não há tempo a perder, logo quando um compromisso se encerra outro começa no minuto seguinte, sem pausas, sem respiro, sem limites. Mas será isso fruto somente de um contexto pandêmico?
O atropelo da vida privada e da parentalidade parece ter se tornado mais evidente quando não há separações entre espaços, mas, como pontuou o professor Ricardo: “Os papeis diversos não são subtraídos em função da sustentação de uma identidade única? O produtivismo selvagem não está usurpando os diversos outros sentidos e vivências?” E finalizou dizendo que as pressões parecem impor um profundo desequilíbrio entre a vida privada, a parentalidade e o trabalho, que passa a ocupar grande parte dos desejos e investimentos efetivos e cognitivos de cada docente. A chama precisa permanecer acesa, é preciso continuar debatendo as condições e a organização do trabalho da categoria docente. Só assim é possível repensar a Universidade e o fazer laboral docente de forma a conseguir uma melhor conciliação entre vida privada, parentalidade, trabalho e sentidos.