Acontece no APUBH

Conjuntura político-econômica é debatida em mesa redonda promovida pela APUBH

A APUBH promoveu a mesa-redonda “Conjuntura e Universidade: Por que somos o alvo?”, nesta quarta-feira (07/11), no Auditório 1 da Faculdade de Ciências Econômicas (FACE/UFMG). O debate contou com a participação de docentes, técnico-administrativos, estudantes e membros de outros sindicatos e movimentos sociais. O vídeo da mesa-redonda está disponível no Canal da APUBH no YouTube. Para acessá-lo, clique aqui.

A mesa redonda contou com a participação dos professores Plínio de Arruda Sampaio Júnior, livre-docente do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (IE/UNICAMP), e Bruno Reis, da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (FAFICH) da UFMG. O debate foi mediado pela professora Deise Luiza da Silva Ferraz, da FACE/UFMG e vice-diretora de Finanças da APUBH.

Plínio de Arruda Sampaio Jr.: “Negação de toda cidadania aos trabalhadores. Essa é a essência da crise no Brasil”

O professor Plínio de Arruda Sampaio Jr., livre-docente do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (IE/UNICAMP), ressaltou que dominação burguesa que ameaça os direitos previstos na Constituição Cidadão, de 1988. “Negação de toda cidadania aos trabalhadores. Essa é a essência da crise no Brasil”, definiu. “A nossa luta é contra a barbárie”.

De com acordo com o professor, há uma crescente ameaça do autoritarismo, expresso no cerceamento de direitos civis e trabalhistas que emulam a intervenção militar. Sampaio acredita que o enfrentamento deve vir de uma intervenção popular, fruto da reação dos trabalhadores a partir do acirramento da luta de classes, que resulta deste cenário. Ele frisou ainda o desafio de ampliar a discussão em uma perspectiva mais ampla, para além da Universidade. “É preciso resgatar o pensamento crítico”, pontuou.

Professor Plínio nos traz a contribuição de que não se consegue compreender a crise política e econômica brasileira sem observar a posição em que o país se encontra na divisão internacional do trabalho. Para ele, a extrema direita conservadora ocupa um espaço em função de ter êxito em se apresentar como o novo na política, ainda que esse novo não tenha apresentado um projeto explícito, porém, implicitamente, o projeto é claro: retirar todos os direitos da classe trabalhadora tanto na esfera econômica quanto na esfera dos direitos civis, instalando um novo período de colonialidade no país, chamado por ele de neo-colonialismo, posto que haverá um recrudescimento da subjugação da matriz produtiva nacional aos interesses do capital internacional.

Nesse contexto, Plínio Sampaio destaca os desafios da esquerda: produzir a unidade da luta e um projeto que possa disputar o “ser novo”, projeto que tenha o trabalho como sujeito histórico. Com os brasileiros e brasileiras estando desacreditados da institucionalidade política estabelecida pós-democratização, faz-se necessário reconquistar a confiança na política e isso demanda um projeto. Nesse ínterim, a Universidade tem uma responsabilidade, contribuir para construi-lo. No horizonte desse projeto, para Sampaio, há de estar o socialismo, não enquanto prática idealizada, mas como um elemento que unifique as estratégias de luta da esquerda.

Bruno Reis: “Manter a defesa intransigente dos valores que constituem a Universidade”

O professor Bruno Reis, da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (FAFICH), prosseguiu o tema do ataque aos direitos trabalhistas. Segundo Reis, estas medidas são atitudes deliberadas que visam beneficiar os interesses do capital, em detrimento da classe trabalhadora. “Altos graus de pobreza geram mão-de-obra barata, pronta para ser explorada”, definiu.

O estudioso abordou ainda a perseguição à categoria docente, expresso na tentativa de censura do conteúdo programático, ministrado em sala de aula. Trata-se, de acordo com ele, de uma tentativa de intimidação, que faz com que estudantes e sociedade se voltem contra as professoras e os professores. Além disso, outro resultado apontado é de que, temendo represálias, os próprios docentes se auto-censurem. “Quando entra em sala de aula pensando nisso, já perdeu”.

Contudo Reis aponta que o cerceamento da liberdade de cátedra coloca em risco a pluralidade de ideias, que é próprio do meio acadêmico. Em reação a essa perseguição, o professor afirmou que é preciso “manter a defesa intransigente dos valores que constituem a Universidade”.

Professor Bruno Reis, por sua vez, destacou por meio de um comparativo, o momento atual da política brasileira com o período de continuidade aos projetos da burguesia que tinha em Fernando Collor de Melo seu expoente, para ele, não se trata de uma mera repetição do passado, mas de uma continuidade, após um período de ruptura, de um projeto de Brasil cujo grau de perversidade é ainda maior. A fala do professor reconstituiu os últimos 30 anos da política nacional, sintetizando o desenvolvimento e as lutas partidárias brasileiras, que culminaram, segundo ele, na derrocada do PSDB, no fortalecimento do PT e na consolidação da extrema-direita.

Para Reis, os ataques às instituições democráticas fragilizaram-las e o grande desafio é resgatarmos a confiança na política e em suas instituições para que a democracia seja preservada, tendo em vista que do governo federal futuro nada ainda podemos dizer com clareza. Nesse movimento de restabelecer a confiança nas instituições, a Universidade tem a tarefa de se reapresentar à comunidade em geral. Segundo Bruno, é preciso sairmos do campus, divulgarmos o que produzimos intramuros e escutar as demandas sociais.

Debate

“A gente luta contra o projeto ‘Escola Sem Partido’, que nada mais é do que um ataque à democracia fraca que já temos”, pontuou a professora Ana Elisa Cruz Corrêa, do Colégio Técnico (COLTEC), que integra a Diretoria de Ações Sindicais e Carreiras Docentes da APUBH. “A democracia se torna a bandeira por excelência, que por um lado unifica e por outro esconde. É como se nós não tivéssemos mais condições de retomar aquilo que nos possibilitava atuar em diversos espaços”.

A jornalista e cientista política Diva Moreira, que é ativista do movimento negro, participou do debate. Moreira analisou que o povo negro, que vem enfrentando problemas desde de sua chegada em nosso país, tem na conjuntura atual um momento particularmente negativo. “Para nós, povo negro, a democracia não chegou, a Constituição de 1988 não chegou. O que sempre vigeu no nosso meio foi um estado de exceção. Nunca chegou a democracia para o nosso povo de favela, de periferia, de baixada”, enfatizou. “Eu estou extremamente pessimista em relação ao futuro do nosso povo nesse país. E, é claro, que nós vamos reagir”.

A questão das lutas identitárias foi também central na fala da professora da Faculdade de Educação, Cristina Gouvea, que relata a dificuldade de trazer o reconhecimento de classe para os estudantes e as estudantes que nas últimas décadas têm se ocupado da defesa de seus direitos civis. Depoimentos e provocações qualificadas foram, pela audiência, destinadas à mesa. O tempo reservado a nossa atividade não foi, como imaginávamos, suficientes e novos encontros serão necessários para seguirmos acumulando massa crítica acerca do momento histórico vivido e dos desafios que se colocam, sobretudo para aqueles e aquelas comprometidos com a defesa de uma sociedade justa, igualitária, livre e verdadeiramente democrática.